FELIZ ANIVERSÁRIO, MARTA!

 Sim, Olga rasgou as fotos. Todas elas! Mas preservou os porta-retratos. Disse que conteve seus impulsos de atirá-los à sorte de paredes de gesso. Argumentou que eles não poderiam ser culpabilizados pelas mentiras que sustentaram durante esses anos em suas frágeis e baratas molduras.

        Ao acender o próximo cigarro, lamentou cada vivência que fora reduzida drasticamente a nada. E depressa consertou:

       _ Não! “Nada”, não. “Nada” é um estágio promissor, na verdade. É uma estaca perpendicular cheia de possibilidades. É um vir a ser. “Nada” talvez seja até mais bonito, neste caso. Sem qualquer mancha, estrago ou vestígio. Se fosse “nada”, significaria que não haveria toda essa dor e desilusão. Lamento as expectativas, obviamente. No entanto, aceito que serviu a mim e às crianças. Não concordas?

        Seu único retorno, o reposicionar da cabeça de seu dócil cão, Raj, acompanhou um breve latido instantes depois. Como quem fora salva repentinamente de um monólogo, Olga fitou Raj e continuou:

        _ Eu sei – baforou a fumaça. E tenho dito: Embora seja a feminilidade uma dádiva, ser mulher tem um significado social fastio. Como se nascêssemos premiadas com um câncer cultural. Tolas! Todas somos tolas em alguma medida. As que escolhem por dinheiro, sofrem. As que escolhem por amor, sofrem. As que não escolhem, ou abdicam, sofrem. Todas elas sofrem quase que gratuitamente, negligenciadas vociferando afirmações constantes num labirinto, a deriva de encontrar qualquer saída insopitável. Cada escolha um jazigo, poucas se realizam sem empecilhos.

        Observei atentamente àquela cena. Dei-me conta de que Olga tinha alguma razão naquele exato momento. Pois veja, eu, uma senhora de 77 anos, posta num jardim a espiar dramas pelos vidros de portas alheias. Aliás, dramas convertidos à borrões, por méritos de minha miopia. Senti-me tola!

         Ah, Olga! Tinha tanto de mim. Ouvi-la era como se deparar com uma versão jovem de mim. Talvez ambas tivéssemos como hobby a tendência de tecer e abrigar filosofias inóspitas a humores tempestivos. Hesitei, mas não por muito tempo. Denunciada aos latidos, toquei sua campainha.

         Uma mulher magra, de olhos fundos e cabelos relativamente despenteados apareceu à porta. Como vestígios de uma boa anfitriã encontrei o que restou num sorriso plástico que se esforçara numa tentativa de cumprimento:

        _ Bom dia – protegia os olhos do sol com sua pequena mão. Como posso ajudá-la?

        Desapontada, tirei meus óculos escuros a fim de ser melhor notada. Finalmente Olga exclamou:

        _ Tia Marta! Que saudades!

         Recebi um abraço acalentador que me aqueceu a pele por baixo do tecido e também, minha alma; como se não tivesse sido abraçada por todos esses anos. Aquela garotinha que a meu modo criei, era agora uma mulher. Seu abraço era tão firme e cheio de segurança e poder. Quase que sem vestígios de uma pequena garotinha que surgia à minha cama repentinamente e me abraçava cheia de medos em madrugadas chuvosas.

         Depressa entramos e o chá estava posto. Lembro-me de ter feito introduções baratas, reparando em sua mobília, elogiando sua louça e criticando pequenas escolhas, feito a mãe simbólica que me permiti ser. Na verdade, me peguei reproduzindo o que aprendi – e tanto criticava em pensamentos.

         Dentre falas corriqueiras e atualizações de tramas familiares, ela me lembrou que era o meu aniversário. Disfarcei as lágrimas. Mas não com perfeição, diante de Olga. Eu era uma boa atriz diante de muitos. Mas não diante dela. Sua sensibilidade fazia de mim uma péssima atriz!

        Eu era mestra em lidar com situações robóticas e automáticas. Especialista em comportamentos humanos superficiais e condicionada à suas reações prontas. Mas Olga, desconcertava minha práxis. Sobretudo, a atenção gratuita dada a mim. Além de enxergar-me, ela via a mim. E não por gratidão, mas por essência. Aniversariante, lá estava eu – bagunçada –, mais uma vez, por Olga. Quisera eu ter méritos por sua personalidade intrigante, hermética e absconsa. Mas Olga era dona de si e auto moldada.

         Seu marido chegou cumprimentando-a com um apaixonado beijo. Talvez estivesse tão surpreso ao me ver, quanto eu a ele. Repentinamente senti-me tão ridícula quanto achava minha mãe, quando eu tinha a idade de Olga. Acometida por um flash de lembrança, provavelmente fiquei em silêncio tempo suficiente para que Olga e seu marido se atualizassem de suas curtas ausências pela manhã.

        Era eu um projeto tão promissor – mergulhei. Um punhado de décadas depois, como num sopro, e quase que fora de meu controle, tornei-me todas as versões que odiava em minha mãe. Flashes distantes foram revividos em lacônicos pensamentos. Em meados dos anos 60 – lembrei-me por um instante – era corriqueiro sentir o sol aquecendo meus cabelos em tardes ativistas. Num destes flashes eu batia a porta ao sair pra uma marcha qualquer de movimento social e recordo-me de ouvi-la gritar de longe “Marta, tu não arrumarás marido com esta vida”.

        Diabos! – retornei. Toquei a campainha pronta a consolar Olga por qualquer desventura em seu casamento. Introsca e embebida de presunções, só então reparei nas fotos rasgadas. Senti-me ainda mais tola que antes, e mais míope que nunca ao constatar as reais subjacências de seu monólogo que tortamente bisbilhotei. Este em medida alguma estivera relacionado ao seu jovem casamento.

        Investigando melhor em prosa, despida de projeções e subjetivismos, pude descobrir sua experiência como pediatra voluntária na cidade Siem Reap, no Camboja. E o fim de seu vínculo por motivos genéricos como tramas internas, disputas de poder, e a não renovação de seu contrato justificada por ações machistas e misóginas da gestão local. A queixa de seu fardo feminino era puramente de motivação e angústia profissional. E eu, como fruto das vivências de minha mãe, converti valores pessoais em projeções sociais sem me dar conta. De certo muito me distanciei do âmago daquela jovem ativista sem temores dos anos 60.

        Dei-me conta de que nunca havia chorado tanto em outros aniversários. Senti que envelheci ali mesmo; naquela sala, ao balançar da cauda do cão, bebendo aquele mesmo chá por muitos anos. Minha “garotinha” Olga, recebia à porta suas próprias “garotinhas”. Desejei num pensamento sorrateiro que ela não perdesse sua ativista interior. Que não envelhecesse repentinamente. Bebendo chá em seu aniversário sem se dar conta, acometida por minhas projeções prontas.

**Chinaira Raiazac**

El’la.

Um romance de montanha-russa passa por uma viela,

Frequentemente se auto duela. 

Alimentando a somatória de erros ele apela.

Atuando diz ele que zela,

Enquanto a sós, brinda à mazela.

Pro passado dá uma piscadela,

Dançando ele descongela,

Des (mante-la).

 

Mergulhados em lágrimas, a distância veio dela,

Cujo único motivo era a própria distância dela,

Sem outros motivos, o copiado menino revela.

Anos depois, “é só um click numa tela“.

Enfiando a conveniência na goela,

Diante do fato de que não há filas pra ela.

Céus! Não há filas pra ela!

Completamente ciente do apego e da nostalgia bela.

 

Consolida-se o reinado da hipocrisia nesta novela! 

E eu que ascendia velas,

Pra todas elas,

Deparei-me com um romance de tabela.

Quando foi que tornei-me bagatela?

Me escoro na janela,

Ao observar a arte da mazela.

Minha aquarela,

Agora quer-ela.

Meu amor com ácido na panela,

Cozinha e se rebela.

Um amor de panela,

Já na ti-gela,

Se auto modela,

Balela!

 

Chamou de passado o que na verdade só protela,

Enquanto guardou um pedaço do bolo à donzela.

Era uma festa daquelas,

Na qual ele gritou “congela”.

Tá ali, um tabu, um rombo, uma sequela.

Mas toda vip é ela,

Sem filas, preocupações ou cautela.

Mas viajante sou eu e ainda tagarela,

Afinal não soube validar a ausente inimizade da caravela.

Mas viajante sou eu e ainda tagarela,

Do tipo que até as minhocas, martela.

 

Viajante que sou, advirto: abro mão da tutela,

Cansada de mergulhar querelas,

D’um romance que se auto pincela.

Me flagela,

“Sem querer” esfarela,

E pra consertar, atropela.

 

Sortuda ela,

Que teve e tem pluralismos de mães dela,

Pais dela.

Para tal posto, até o afeto de quem já se foi repousa somente nela.

Talvez até nisso esteja errada a pobre tagarela.

Sob pressão diz ele sobre ela,

É casa abandonada, mas seus atos a visitaram feito cela.

Ella

**Chinaira Raiazac**

Chama em Chuvas!

Lá vai a cética,

Lá vai a cética bruxa,

Lá vai a cética bruxa mentirosa.

 

Lá vai ela,

Lá vai ela sambar,

Lá vai ela sambar no escuro.

 

Lá vai ela sapatear,

Lá vai ela sapatear sobre o sonho,

Lá vai ela sapatear sobre o sonho sangrento.

 

Mas que beleza,

Mas que beleza tem ela,

Mas que beleza tem ela no escuro?

 

Moça bandida,

Moça bandida de si e perdida,

Moça bandida de si e perdida no escuro.

 

Escuta menina,

Escuta menina o: “eu te amo”,

Escuta menina o: “eu te amo” em cima do muro.

 

Acorda,

Acorda menina,

Acorda menina, sua boba.

 

Desperta!

Desperta menina,

Desperta menina a sua loba.

 

Lá vai ela,

Lá vai ela cheirar,

Lá vai ela cheirar flores.

 

O faz dentro de si,

O faz dentro de si amores,

Faz dentro de si amores e horrores.

 

Rufem,

Rufem os tambores,

Rufem os tambores espectadores.

 

Espeta,

Espeta, Expecta,

Espeta, Expecta-dor-a.

 

Lá vai,

Lá vai a louca,

Lá vai a louca e mestra.

 

Não tem piedade,

Não tem piedade de ninguém,

Não tem piedade de ninguém que a ame.

 

Sem piedade,

Sem piedade pro amor,

Sem piedade pro amor em cima do muro.

 

Lá vai a chuva, Lá vai a chama,

Lá vai a chuva em chamas,

Lá vai a chama em chuvas!

 

Lá vai ela,

Lá vai ela noiva pipoca queimada,

Lá vai ela noiva pipoca queimada moribunda.

 

Lá está ela,

Lá está ela cheia,

Lá está ela cheia de adjetivos.

 

A chama ascendeu,

A chama ascendeu e queimou,

A chama ascendeu queimou e machucou.

 

Ela quer lar,

Ela quer lareira!

Ela quer lareira mais que acesa.

 

Bendita seja

Bendita seja a chama,

Bendita seja a chama que não chame pelas próprias cinzas.

Chama em Chuva

**Chinaira Raiazac**

Banho-Maria

Com um charme vem,

Com as (des)memórias se esvai.

Com o doce brinda,

Com o amargo cai.

Como feitiço e dom,

Bebeu demais.

Um sonho bom,

À luz do cais.

O encanto perfurado,

Ainda dói demais.

Um sonho sangra,

E por vezes se desfaz.

Uma fumaça revela-dor-a,

Exalta um pedestal quebrado.

Mostra desde a antes coleciona-dor-a,

À atual governadora de um estado condenado.

Que mal há de se fazer,

Se ele mais uma vez,

Se esquece do que nunca lembra?

Que mal há de se fazer,

Se mais uma vez eu fracasso em me esquecer,

O que insisto em lembrar?

Numa panela feia era eu,

Um caroço de milho ao breu.

Dona de mim e ao óleo,

Dançando feliz e inconsciente o próprio velório.

Então tudo era ebulição.

Aqueci feito o grão,

Com paixão e excitação.

Repentinamente o óleo ferveu,

Feito noiva decolei,

Feito pipoca explodi.

Como noiva pipoca sonhei,

Como noiva pipoca queimei.

O óleo esfriou,

Eu consenti.

Do grão ao breu,

À pipoca queimada e fria.

Ainda sou eu,

No o óleo que esfria, e esfria.

Engravidei todos os dias,

De expectativa debutante.

Doeu-me por demais,

O posto de falida lactante.

Não sei se abortei ou expeli,

Se regurgitei ou explodi.

Fato é que a ilusão não mais mora aqui.

Com um charme veio,

Com as (des)memórias se esvaiu.

Com o doce brindou,

Com o amargo caiu.

Como feitiço e dom,

Ainda bebe por demais.

Um sonho bom,

Uma aventura a mais.

Que não ouse o atrasado,

A esquentar uma fria pipoca queimada.

Que não ouse esse coitado,

Queimar-se em óleo por nada.

Nesta cozinha,

Agora se vive de Banho-Maria.

Se cozinha lentamente a vida,

Sem pressa de saber onde ela me levaria.

Não!

E que não ouse o atrasado,

Questionar.

Não!

Será a única resposta,

A se aprontar.

Não!

Não!

Não!

Senhor acovardado,

Por favor não ouse o desejo de reaquecer.

Engula o Feliz Aniversário!

E respeite sua escolha de banho-maria a envolver.

banhomaria

Chinaira Raiazac

 

Não Minhoca assim!

Infante, leiga e cética.

Reformulando a mobília das certezas,

Reciclando a própria ética.

A fumaça leva o mancar,

Pras sombras do ínfimo, infame em fome,

E rega um novo chinairar a cada raiar.

Chinairar, Raiar, Manca-ar!

Chinaira, Manca.

Novo Chinairar: novo Mancar.

Os picos que sangram, levantam as cinzas,

Enquanto eu lambo a cada desgraça,

Ainda que torta, e torta ainda.

Bebo mais de mim a cada silêncio,

Me fumo e me cheiro, em cada nevoeiro.

Dos arsenais, à própria tempestade no cais.

O desejo é torpe, não é nada demais.

Um urso para duas cavernas, faz bem ademais.

Uma caverna pra dois ursos, jamais.

O desejo é torpe, não é nada demais.

De minha carcaça, albatroz, um corpo aqui jaz.

My point of view, your POV: our distance!

Tenho cicatrizado porque amo,

Ou porque amo devo obrigatoriamente cicatrizar?

Paciência, sou atriz, aprendiz e torta.

O amor pinga, pinga e transborda.

Há no amor uma maldita pinga, e eu,

Desde sempre, dispenso a borda torta.

Extasia, anestesia, ilude e convém.

O amor sabe atuar e amar como ninguém.

E eu, aprendendo a amar a mim, e outro alguém.

Aprendiz, cética, senta e observa,

Encontra mais de si e de vende-dores,

Nas quinquilharias, uma boa oferta, uma descoberta.

 Pra, (mim, ti) e pras paredes, andei gritando sem escuta.

Agora sou o próprio silêncio,

Muda, sem pulsão, sem movimento.

Muda, calada, suscetível a tudo e nada.

Calada e muda. Torta!

Observando o que não muda. Admirando a borda.

Distância estrondosa, homem torto!

Lateja o sintoma torto, a mulher torta.

Vêm regando como um todo, dispensando a borda.

Nenhuma palavra a mais, sintoma torto.

Que morda-se a borda torta como um todo.

Já que ofereces à tempestade do mar, um torto e curto rodo.

O rodo é curto e torto. Eu Caio demais.

E o mar manca, nada demais.

Um dia, em silêncio, tudo vira old times.

Descobri que sou mais burra que podia,

Os tragos, as brasas, me assolam à luz do dia.

Sofro, choro, sangro; do amor, o sabor e o dissabor.

Eu Caio de menos, eu Caio demais.

Sobre o veneno eu brindo,

Uma quinquilharia a mais.

Não minhoca assim

** Chinaira Raiazac**

 

 

 

 

 

Vendeu-se escorpião em adoção

          Carmen recusou o coração de um escorpião, e este por completo ao notar que faltara partes do pobre animal. O coração ali estava, aos seus pés. No entanto, o corpo estava noutra cidade e o pênis fora perdido numa orgia marítima. Sim, Carmen recusou-o com razão. Argumentara que de nada lhe serviria o fragmento, uma vez que, feito Cecília, partes cardíacas soltas por si só não lhe apeteciam nas compras em alto mar.

– Podemos adestrá-lo e torná-lo inteiro, senhora. Castraremos-o e este será ….

Carmen irritou-se com o vende-dor.  Interrompeu-o. Tal senhor não entendera que ela buscava algo inteiro, livre, sincero e autônomo por si só, sem sacrifícios, adestramentos ou concessões. O problema não eram as orgias ou as cidades, e sim a neblina em alto mar e em fragmentos diminuídos gratuitamente. Castrar um escorpião não lhe convinha.

Maldito vende-dor! Garantias falsas, desde a adoção, na qual reforçava-se inteireza numa abordagem franca. Mas só lhe restara faíscas. Ora, se Carmen cansara-se de hipocrisias do mar, certamente tais propostas furadas não lhe faziam sentido. O mar todo adentraria aos poucos tantos furos. E o sal logo corroeria ou germinaria a todas as faíscas. Mazela ou não, fato é que Carmen apaixonara-se pelo escorpião a venda ou adoção. Apaixonara-se com leal espontaneidade. Algo a impedia de descartá-lo prontamente como mandava seus velhos hábitos.

Deixou então que o vende-dor publicizasse seus otimismos baratos. Ouviu. Ouviu. Tempos depois entregou-se a estes. Na pior das surpresas desvendou desgastas mentiras do vende-dor. Afinal era ele essencialmente um vende-dor. No ramo da publicidade marítima diz-se que são todos iguais. Alguns mais albatrozes, outros menos. Sorrateiramente numa sombra cálida e gélida era menos. Era menor que um projeto de homem arquitetado em moldes de quinta categoria a discrepar palavras de atos.

Carmen custara a acreditar que ouvira com esmero um clichê vende-dor de escorpiões alimentado pelo imaginário coletivo do marketing e da propaganda. Diz-se mesmo que são todos iguais. Sábia ou tola, foi surda. Mas os olhos pagaram o preço. Por vezes também os ouvidos.

    Talvez por amor acolheu e recolheu os cacos. Mas amor não se mencionara ainda. Pobre Carmen! Picada pelo escorpião pelo qual deixou-se apaixonar. Doeu insuportavelmente. E embora ela soubesse que não era o fim, precisou cicatrizar-se miseravelmente. Mas Carmen é de difícil cicatrização, admite. Mais ainda quando o estúpido vende-dor é explicitamente convocado a desculpar-se e nunca comparece à audiência com nitidez.

Aí é que então evidencia-se: Culpado! Nada havia de incomum no produto escorpião, senhor vende-dor. Vosso imaginário era tão impregnado coletivamente por clichês como outros. Este, como outros, picava e como outros doía. E muito. Este jurava que abjurava, sem necessidades. Dizia que preferia mas preteria, secreta e dolorosamente. Talvez o pior dos fatos tenha sido brincar com estes parônimos. Já que era, na verdade, um grande come-dor de caldas infectadas do mar. Comia a todas num ritual que prezava seu ponto de vista para comê-las mais realisticamente possível. E como gozava ao rito, como um nato come-dor! Grande come-dor! Agora sim inteiramente albatroz.

Carmen realmente enfrentava dificuldades de cicatrização. Não pelos atos, mas pelos parônimos. Cortes aparentemente superficiais lhe foram profundos. Carmen tinha pele plástica, compunha ambos dotes: Fragilidade e Resiliência. Ela viu o mar em tempestade. O céu desabou em sua cabeça. Farsas celibatárias que comprara no mesmo pacote também desmoronaram instantaneamente e o terreno mais bonito que conhecia sobre águas marítimas tremeu-se. Abalou-se.

Desespero marketeiro ou não, o vende-dor de escorpiões marcou o ato pedindo descontos e propondo uma grande promoção. Carmen silenciou-se. Agora sim mencionara amor. Ouviu sobre amor, sob estrelas. Mas tremeu. Como tremeu! Estava frio e não sabia lidar com um amor de promoção num frio atropela-dor que alcançava sua alma. O silêncio marcara o evento da promoção. Carmen propôs um acordo de cristalinicidade a dois. Mas tem repensado a sós. Não sentiu real aderência por parte do vende-dor de escorpiões. Pelo contrário, pequenos atos cotidianos lhe foram laboratórios de legitimações. E estas de lados opostos. Em seu laboratório Carmen analisara o escorpião adquirido pelo vende-dor sob microscópio. Tudo que se via a olho nu era bastante comum à espécie. Mas ela intuía que não se tratava de algo completamente parco ou reduto. Sentia que o melhor não se via. O problema é que seus olhos nus não acompanhavam um incólume coração. E o laboratório de olhos nus nem sempre favorecia. O escorpião em adoção fora subitamente vendido, senhor vende-dor.

Carmen se dizia impávida e é. Mas também é frágil esta mulher. Seu coração está aos cuidados de um escorpião. E ela tem relevado o vende-dor. No entanto também tem alimentado minhocas em seu laboratório. Basta! Antes que seja engolida é hora de repensar acordos. Perdeu-se muito, fato aceito. Carmen não quer gozar a luz de uma zona de conforto que afirma vende-dores como errados. Mas adotar ou comprar escorpiões é trabalhoso por demais. E ela não havia ido tão longe. Até mesmo medica-se para legitimar a existência concreta da assiduidade. Mas Carmen é também ácida. Prometeu a si mesma não esquecer ser uma Fênix ao se entregar ao escorpião.

vende-dor

**Chinaira Raiazac**

NUTRI-AÇÃO.

E pronto!

Nutri-Drogou-se de

Conservantes, e Corantes,

Espalhados em Cafeína e Taurina, Blues e Nicotina.

Nutri-Drogou-se de Sódio, Glicose, Glúten.

Caio-boidrato, Proteína e Colesterol.

Faltou Ferro, mas teve Fibra e Sol!

Re-aja, feito Nutri-Ação de Isca e Anzol.

É só uma Piri-doxina, e pronto, menina!

Ponha-se a parir escrita, e tire a Enzima de cima.

**Chinaira Raiazac**

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Arte: Gastrovia.com

Fibra, Resiliência, Mérito e Eloquência!

Fibra pra Resiliência.

Resiliência pra não eloquência.

Eloquência pra Fibra.

Fibra por Mérito, Mérito pra Fibra.

Eloquência no Mérito,

Resiliência por Mérito e Fibra.

Se Eloquência não é antagônica à Resiliência,

E se houver Mérito por Resiliência,

E Fibra na Eloquência,

Onde fica o Mérito, Eloquência?

**Chinaira Raiazac**

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Arte: Favim.com

Serotonina Multilinear

Belo é quando, encontra-se a beleza no nublado.

No cinza, na chuva, na lágrima, na gótica e sombria, melancolia.

Quando encontra-se a quem saiba apreciar a riqueza do silêncio,

Sem preencher toda e qualquer lacuna com autoafirmação desnecessária.

Sem taxações e longe de abjetos reducionismos!

Há beleza quando encontra-se  o propósito implícito em cada queda,

E levanta-se sorrindo, mesmo sabendo que cair-se-á outra vez,

Mas sabendo-se, também, que a cada queda acompanha um novo propósito.

Quando eleva-se a auto-existência escolhendo o que alimentar dentro de si.

A beleza mora naquele momento em que se cresce frente às escolhas,

Filtrando o que se cabe e o que não mais.

Belo é quando há ebulições químicas explodindo dentro de si,

Feito uma animação que ilustra coloridas bombas estourando no caos,

Entre neurotransmissores piscando e dançando quimicamente desordenados,

Na multilinearidade vulcânica, desenfreada e explosiva da absconsa serotonina.

Tão belo quanto a invasão de cada nota do blues a impregnar células orgânicas,

Com e sem licença pra entrar,

Feito uma intensa embriaguez orgástica, muda de palavras.

Bonito de não se ver,

Quando se fecha os olhos pra receber o primeiro gole de café do dia.

Quando se sussurra palavras sem sentido ao vento,

Com alegria no coração.

Quando a fumaça leva o que o cigarro trago.

Quando o cosmos lhes envia um bailarino pra dançar os caos.

A beleza reside, também, no riso da própria desgraça,

Afugentando fantasmas e degolando os próprios medos.

Envelhecendo a imunidade e desenvolvendo a resistência,

Condicionando-se feito esponja, sem penitência.

A beleza mora na capacidade de arrepio,

Só de pensar, no bailarino a caiar, feito príncip(eo).

    **Chinaira Raiazac**

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                                 Arte: PS-DUDE.

Happy C’Day: Domingariedades da Vida!

Às 09h15m do domingo de 24 de fevereiro de 1991, em Goiânia, Goiás, o útero de Selene lançava ao universo – via cesárea e prematura de sete meses –  Chinaira Raiazac, que por motivos velados no charme cósmico da neblina, seria registrada apenas no mês seguinte. Ainda que na relação de mãe e filha caiba a brincadeira “Minha mãe atrasou o mês de meu registro porque estava decidindo se dava, ficava ou jogava fora” é divertido pensar que o feito engane as astrologias confiantes em falsos pedaços de papéis quando da avaliação das posições das estrelas.

Pedaços de papéis que a civilização intitula documentação na tentativa de organizar o comboio em massa a partir de registros numéricos, não foram discutidos às claras por Selene e Chinaira quando da especificidade discrepante dessas datas. Mas, claro que o espírito arteiro e infante de Chinaira questionaria Selene aos seus 10 anos de idade, com as mãos na cintura e o pé batendo ao solo, como quem cobrava uma explicação diante da arte de encontrar outro pedaço de papel – teste de Guthrie – o teste do pezinho que desiludia o conhecido março e denunciava o tal velado fevereiro.

Sem engolir as explicações da década anterior, noutro domingo de 26 de fevereiro de 2017, então em São Paulo, Chinaira se põe a pensar nas tentativas, erros e acertos escondidos nos escombros das subjacências de 26 outonos, primaveras, verões e invernos de sua vida, num país tropical que abarca, por vezes, as quatro estações no mesmo dia. Chinaira e Brasil têm muito em comum nesse sentido. A tropicalidade que engole variações pluviométricas chocando cronos e kairos, caos e calmaria, períodos secos e úmidos marcaram presença nestes 26 processos de quatro estações. Neste sentido, Chinaira é o próprio Brasil a escrever história na chuva carnavalesca de fim do fevereiro, que a faz olhar pra dentro enquanto observa ruas alagadas.

“Como é fazer 26 anos?” e “O que mudou?” – houve quem perguntasse. Claro que, como Jurema, dever-se-ia fazer uma tese de doutorado acebolada pra responder a complexidade da pergunta sem o reduto de grãos de arroz. Vamos ver o que mudou: Chinaira continua pulsando entre vida e morte. Continua acordando e adormecendo. Continua sagrando mensalmente pra fazer jus à oferta biológica que lhe foi feita da combinação cromossômica XX. Ela aceita e continua rejeitando e expelindo seus óvulos não fecundados. Continua na solteirice e na cama de solteira, num cubículo. Continua às moscas e faíscas num depósito de tralhas. Continua sensível, como é sua essência. Continua se apaixonando por animais, crianças, e momentos lacônicos, feito estrelas cadentes. O coração de Chinaira continua bombeando sangue pro resto de seu corpo. Suas sinapses neurais continuam caóticas, herméticas e parabólicas, ainda que suas células não tenham sequer experimentado substâncias tais como cannabis ou mais intensas – sem aspectos pudicos, castos ou de orgulho, é apenas um registro, afinal não há possibilidades de sair de mercados, padarias ou farmácias ocidentais sem consumir drogas. Outro registro nada casto ou pudico é fato de que à essa altura do campeonato o maior órgão do corpo de Chinaira, sua pele, não recebeu agulhas com tintas que marcassem em tattoos seus gostos, jeitos, apreciações, tendências ou filosofias. Chinaira não teria respostas prontas dos porquês não se tatua. Talvez não sucumba à moda, talvez lhe faltasse pele se decidisse usar a sua própria como tela de projeção do caos em si, talvez pelo temor de que sua essência metamorfósica ou sua vênus em áries enjoasse depressa de tudo que é estático ou se cristaliza. Mas tem preguiça de vasculhar o arroz dessa resposta.

Chinaira contínua e continua! Chinaira continua se entupindo de cafeína. Mas bebe bastante água por teorizar sozinha que, além de ser bastante saudável, num continuum o ato evita danificar seu estômago. Aliás, a cafeína é mais amada que antes, por simbologias românticas. Chinaira contínua e continua! Continua apreciando a esporadicidade da nicotina mentolada. Continua ouvindo velharias musicais excêntricas e continua uma eterna adia(dor)a. Continua elevando os saldos dos débitos das dívidas egóicas de filmes, séries e literaturas. Não é nerd, nem geek, nem poser. É Chinaira, contínua e adia-dor-a. Não atua nas peças, nas regras, não dá a mínima, por vezes. Por vezes lhe falta vida ou temor pra seguir o teatro escrito por outrem. Chinaira continua nos silêncios, respeitosos de melancolias e tickets de viagens dentro de si. Continua fazendo de seu cabelo um arco íris não simultâneo. Ah, essa sim é uma boa tela de projeção. Imagine você que, aos 26 de fevereiro de 2017, já se teve 4 estilos e cores de cabelos neste ano, sendo o atual um preto curto que ascendeu a iluminação natural da face de Chinaira. Talvez agora sossegue – digitou e riu.

Chinaira continua brincando com fogo, se expondo sem se expor, num mundo que enxerga mas não vê, escuta mas não ouve. Continua gozando a vida. Continua respirando, se alimentando e se banhando – sempre que possível. Continua conversando com cachorros de rua, dando atenção às almas embriagadas – que não sexualizam o tom do encontro. Continua conversando com almas estranhas, nos transportes, nas ruas, calçadas, nas filas, nas oportunidades da vida. Continua recebendo e aceitando os sinais do cosmos. Imagine que rasa coincidência agradável seria ouvir o coletivo da vizinhança cantando “Parabéns” pra alguém sem entender o cosmos e receber a canção também pra si. Contínua e continua a ajudar a tudo que respira, sempre que pode. Chinaira, feito louca ou bruxa, conversa também com objetos inanimados. Chinaira conversa com tudo, na verdade. Chinaira conversa, ponto. Continua conversando! Continua escrevendo, ou transcrevendo. Continua mestre de meia tigela, se auto desqualificando em silêncio e a sós por saber que os pedaços de papéis que a reconheceriam academicamente como mestre são atuações em nível macrossocial. Mas continua perseverante no sanar de suas lacunas pessoais, com a humildade do silêncio que pode ser alheiamente qualificado como fraqueza. Continua outsider das redes sociais, e tentando socializar de verdade. Continua sentindo falta da falecida caixinha, mas também continua longe de suplicar por migalhas de inverdades. Continua malhando, (há menos de dois meses) claro. O faz por saúde e uma pitadinha estética. Continua faminta de culturas, mundos, idiomas, pessoas, combustíveis sensitivos e descobertas nascituras.                                                                                                                 Chinaira não é mais professora estadual, o que lhe possibilita finalmente dormir mais de 4 horas diárias. Mas Chinaira continua nascitura professora, de projetos sociais voltados à pessoas em situação de rua, usuários de substâncias lícitas e ilícitas, pessoas trans e até professora de instantes nas ruas. Continua, Bertha, Elizabeth, Larry, Cecília, Jurema, Marília, Senhora, Sóbria, Bailarina Torta, Niarachi, feito fases de Sofia e velho Fuzil, como “Oráculo de Mil Nomes”. Continua na estatura baixa, no peso aceitável. Continua engolindo pensamentos e expelindo pérolas. Então o que mudou, se só se usa “continuação” nessa linguagem toda? Se continua X, Y, ou Z, então, e talvez, nada tenha mudado, além do envelhecer da aurora de sua carne, espírito e perseverança. No pessimismo continua desperdiçando saúde mental, cronus, óvulos e perdendo audição. No realismo de seu otimismo ganha kairos, tara e vivências, resiliências e até amores e paixões, em doses nada homeopáticas que temperam a sede de cidades vizinhas ao seu modus itapeviense operandis. Contínua e continua! Feliz aniversário pra você que reseta o relógio sem apagar os erros e os danos, por entender que seu presente e futuro carregam inerentemente seu passado. Feliz aniversário pra você que continua e continua, sobretudo, escrevendo na terceira pessoa.

   ** Chinaira Raiazac**

Dorival, o bom Caminhoneiro!

Quentes gotas de suor escorriam pela face envelhecida de senhor Dorival, enquanto pegava a estrada de terra. Virado há dias e à base de cocaína, sua corrente sanguínea pulsava seu físico sobrepeso em prol de mais uma entrega no litoral. Ele não notara, mas o escaldante Sol lhe ardia a pele do braço esquerdo e o fazia sentir-se ainda mais cansado. Como herói desvalorizado socialmente enfrentava os perigos de curvas mortíferas ao descer engrenado e mascando fumo na companhia do rádio que chiava.

          Se essa coisa de meritocracia funciona mesmo, como insistem alguns, sabemos que Sr Dorival não se esforçou o bastante pra ser diferente do que é. Certamente enquanto plantava mandioca na infância, e se ausentava do espaço escolar, já escolhia conscientemente ser o bom homem que se tornou.

          Sr Dorival, hoje casado e que se autointitula bom homem, humilha intrépido à luz do dia, as travestis que pechinchando compra pela noite nas estradas. Bom bebedor dos fracos e adocicados cafés de botecos, e amante de babujadas frituras, se ocupa, por vezes, a palpitar a política partidária brasileira a partir do raso de seu senso comum. Também domina a arte de admirar e recontar piadas xenófobas, racistas, homofóbicas e especistas.

       Este bom homem, bom pai,  bom esposo, e bom caminhoneiro, construído meritocraticamente na infância planta(dor)a e colhe(dor)a de mandiocas, não poupa o baixo calão dos chulos discursos machistas, vulgares, sexuados e sexistas frente às vaginas que passarem próximo à placa de seu caminhão, com os dizeres: “Deus é Fiel”. Ah, sim! Não se mencionara, mas o bom homem, Sr Dorival, também é um servidor religioso e paga em dia seus dízimos à sua igreja!

**Chinaira Raiazac**

dorival

 

A Gosto!

                          Dentre as Debutantes Tentativas,

                        Inevitáveis Assertividades e Erros,

                  Por entre às sinfonias de Risos e Lágrimas,

                                           Vitórias e Perdas,

                                           Pulsa Chinaira,

                                         Faminta pela Vida!

                                           *Chinaira Raiazac*

Questões de Jurema!

Mal dormida há dias, Jurema acordou da tentativa de adormecer. Levanta bocejante e em estado zumbi coça a cabeça. A modernidade e o processo cultural no qual sua intersubjetividade fora construída e alimentada a faz rejeitar seu cheiro natural e clamar por um banho. Lamenta que o café esteja menos aquecido do que geralmente aprecia. Engole assim mesmo. Morno, sem açúcar, desce seco.

Eis que dentre as burocracias cotidianas do hoje, Jurema depara-se com questões do ontem. No dia anterior Jurema é explorada  por uma colega que a saber mais de sua intimidade questiona:

–  O que te inspira?

Céus, infernos, raios, relâmpagos e trovões. Que diabo de pergunta era essa? Não poderia Jurema fazer uma tese de doutorado ali mesmo, crua e às pressas. Não poderia Jurema satisfazer tamanha complexidade em palavras. E caberia aqui a distinção da complexidade fantástica do interior de uma cebola e um cru grão de arroz. Jurema atendeu ao pedido do grão de arroz e o ofertou cru:

– Caos, amor e vida. – respondeu, ontem.

Na progressão do hoje, Jurema nomeia paixões na prosa. E a sagaz colega questiona por mais paixões. Jurema, no ímpeto, assume que são várias e avassaladoras. Mas talvez não tenha se feito entender entre arroz e cebola, quando é questionada por paixões humanas. Ela poderia divagar sobre o quanto se apaixona pela fumaça do calor de seu café a beijar suas narinas, mesmo não tendo sido contemplada com tal benção no amargor de hoje. Poderia tanto! Dizer do quanto se apaixona pelo silêncio do escuro ou pela sinfonia da chuva, com simbologias cardíacas, dentre um arsenal de paixões grandes e pequenas. Entretanto, diante da compreensão de que a pergunta gestava a especificidade de paixões humanas, Jurema simplesmente indagou:

– Mas as paixões se limitam às pessoas?

– Não limita, mas você falou de amor – fora a resposta.

Foi então que Jurema percebeu conjuntos embramados de fatos acebolados dançando em suas sinapses neurais. O primeiro, que talvez só seja possível amar pessoas na percepção de sua colega. E depois, Jurema falara de amor, ou mencionara amor? E falaria ou mencionaria somente amor? Não! Jurema ofertou o grão de arroz “Caos, amor e vida”. Onde estaria Caos e vida?  Se só amor foi pescado, já não falamos de Jurema, e sim da pescadora de respostas que toma pra si projeções que talvez façam mais jus a seus espelhos internos, o que lhe bastar.

Mas mesmo que Jurema não tivesse simplesmente mencionado, mesmo que tivesse se alongado a falar e mesmo que tenha sido “falar de amor”, Jurema não pôde dar o que se pedia. E foi assim que Jurema refletiu sobre a comunicação humana. Não em suas peculiaridades, ora, mas em suas vértices coletivas. Se pegou a problematizar com arroz e cebola as emissões, recepções e ruídos e entre os abismos do que se pergunta, responde, pensa, anseia, constata. No fim, pensou Jurema, as perguntas são como clitóris ocidentais: Uns encontram certa conformidade e satisfação na resposta que lhes são ofertadas, outros passam a vida sem respostas e sem descobrir a magia de se fazer perguntas. E nessa mixórdia a comunicação humana é masturbação que se contempla, ou não.

 ** Chinaira Raiazac**

jurem

Créditos de Imagem: Artes Sales.

SQUIRT!

Dentro da mulher,

Coubera caos e homens.

Dentro da mulher,

Coubera sonhos, filhos e rimas.

Coubera amor, ódio e sangue.

Coubera desejos, força e mundos.

Mas a mulher, é como vulcão.

Se engole caos, homens, sonhos e filhos,

Se engole rimas, amores, ódios, sangues, e desejos,

Se engole mundos,

Tal como vulcão,

Os explode e os ejeta como lavas.

Como mulher, segue a se auto desafiar,

Brincando de engolir e regurgitar.

** Chinaira Raiazac**

chhinnaira

Arte de Nicolas Francois Octave Tassaert

JUREMA

Jurema é daquelas que se presenteia sentindo pessoas.

Jurema vê, além de enxergar e ouve além de escutar.

Aprecia quem sabe viver, além de existir.

Ela samba na vida enquanto aplaude as chuvas.

Jurema não cura feridas com gorjetas,

Nem mesmo encaixota subjetividades pois rejeita gavetas.

Jurema, sábia, louca, bruxa, se entrega ao que for.

Pouco na vida desperta seu temor.

Quanta falácea!

Jurema é sim bundona, céus!

Jurema é fã de almas cruas e falhas nuas.

Se apaixona por defeitos e se alimenta de alheios trejeitos.

Jurema navega entre covers e,

Aclama pra si o que a humanidade há de ignorar ou descobrir.

Jurema absorve o que for,

E sua apreciação simpatizará o que experimenta de negligência.

Entre fama, moda, escombros, patologias e caos,

Aprecia tudo que souber se despir de dicotomias.

Ah, Jurema!

Jurema rabisca ao telefone e ri da própria “hiper-art-ividade” esferográfica.

Jurema escuta, muito ouve, e sempre tenta.

Jurema se encanta pela possibilidade de compreender,

Tudo que diferente de si possa ser.

Jurema envelhece os ovários, a pele e a voz.

Mas não envelhece sob o tom do mundo algoz.

Jurema amadurece, uma alma velha,

Uma alma envelhecida, uma alma amadurecida,

Numa respiração, a velha em si própria, a vida.

A velha Jurema tenta equilibrar-se na tríade a saber,

O Narciso que reside em (e certo de) si,

O debutante que ouve incessante, sensato e apazigua, como libra,

E a velha intrépida que cansada identifica que se trataria de pregação à surdez.

Ah, Jurema!

Como pudera explorar tanto das chuvas?

A velha Jurema aprendeu que há impossibilidade de diálogo,

Com quem mede dores, sabores e dissabores a matar peculiaridades.

Jurema se afasta de quem engole status quo venerando apequen(idades).

Boa sorte, nova-velha Jurema, diz seus (ím) pares.

Jurema os condena imersa em si como criatura aborrecida,

Enquanto prega – e repete – em sua mente uma peça que distingue sorte de labor.

Jurema, atue e ature!

Ature,

Aos que vêem na complexidade da cebola,

O reduto de um grão de arroz.

E ria de si mesma por apequenar o grão de arroz.

Vá Jurema!

Sangrar e se re(compor).

Vá viver, sofrer, se auto tolher e  embeber-se.

Vá Jurema, sorrir, gozar, vencer ou fracassar.

Vá, Jurema! Brindar a cegueira e teimosia onde não te couber

Sobretudo,  prossiga Jurema, a explodir, implodir, pirar e respirar.

**Chinaira Raiazac**

jurema

Créditos de imagem no arquivo.

 

 

Que gire o Sol

No rastro do atropela-dor,

Gesta-se anseio, explosão e temor.

Nada de doses homeopáticas,

Há em paixões que se auto semeiam, senhor.

Entre 10 cafés, freie o acelera-dor.

Na cura do galantea-dor,

Mora o resgate do avassala-dor.

Que as moedas do lago,

Levem de mim todo o amar-gor.

E se as paixões que se auto semeiam florirem,

Quero eu depor, propor, compor,  com louvor.

E se gemo, atropelo dor.

E se engulo, engulo sabor.

E se Caio, levanto meu humor com furor.

Se Caio, seja o vento, condutor.

E se gemo, se engulo, se levanto e se venta,

Também Caio, injeta meu motor!

 

**Chinaira Raiazac**

burning_love_by_pixelnase                                                                              Art: PixelNase

Nu-Dez!

Mostrar-se ao mundo requer coragem e bravura!

Deve ser feito sob a premissa de simples registrar e não de aceitação ou reciprocidade.

Mostrar-se ao mundo requer a audácia de mergulhar nas entranhas da incompreensão,

E continuar despindo-se pra si.

Requer vida, pulsação e intrepidez.

Trata-se de brindar ao cosmos seu papel energético nesse plano,

E receber as críticas rochas como simples plumas que só sabem falar a partir de si.

Portanto, saiba que mostrar-se ao mundo é, muitas vezes, solitário.

Mostrar-se ao mundo, criança,

Requer transcender os subornos ou castigos expressos em céu e terra.

Transcender a miopia da vaidade, julgamento e admiração.

Mostrar-se ao mundo, requer saber mostrar-se à si.

Requer suportar seus eus a sós aos escombros do âmago,

E aprender a dominá-los no escuro sem seus sentidos.

Mostrar-se ao mundo é perder o egoísmo que  mascara-se,

No adjetivo reservado, ao guardar-se só pra si.

E saber que poucos conseguem fazê-lo,

Ou respeitar seu feito. Não é pecado, criança!

Mostrar-se ao mundo funde a máxima do viver e do simples existir.

Mostrar-se ao mundo é mais que respiração intensa.

É fidelidade de si, mesmo diante da repulsa d’um oceano de gente que,

Aprendeu dizer e acreditar que é diferente.

Mesmo diante do embate e do choque que desestrutura

A zona de conforto do que o oceano reconhece como familiar, legítimo, notável.

Mostrar-se ao mundo requer menos lucidez e mais de si próprie!

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**Chinaira Raiazac**

 

 

5 de Desgosto de 2016 – Sonho Desnutrido !

                                                                          PARTE I

     Sabe aqueles arrepios profundos que invadem a essência humana? Dentro do meu ser, eles alcançam um lugar que equivale ao que chamam de “alma”. Eu tenho vários deles. Várias vezes ao dia. São campos energéticos que podem ser explicados por diversas perspectivas fenomenológicas, desde o senso comum, à física quântica. São de todos os tipos, intensidades e durações.

       O combustível deste post é um daqueles arrepios que me faz murchar por inteira. Sinto-me encolhida como formiga. É estouro fatal e é barulho mortífero. Não simplesmente ensurdecedor, mas estrondoso e insuportável. Eu sinto. Recebo. Os olhos marejam e transbordam o que não cabe dentro de mim. É desse arrepio que quero compartilhar com você, que lê tamanha expressão reduzida à uma tela virtual por onde escorregam seus dedos e/ou olhos. Juro: eles tinham de 9 à 12 anos. Estavam em muitos.

        Cordas vocais imaturas denunciavam a infante circunstância. Seus cabelos eram raspados de forma decorativa. Como xadrez e escritos específicos daqueles que conhecem realidades perigosas. Além de perspicaz audição, minha sensibilidade captou a tudo num lacônico olhar, afinal, respeito às dignidades alheias sem fitar publicamente seres estranhos à mim.

       Revezavam-se para consumir álcool. Fumavam algo que minha miopia não alcançava. As infantes cordas vocais cantarolavam o ritmo de uma sexual apologia ao crime. Conflitavam verbalmente pelo álcool. As garotas semi nuas. Os garotos com excesso de metal em bijouterias. Posso re-jurar: Eles tinham de 9 à 12 anos.
O Estado não quer. A elite discrimina. O capital escraviza. A classe média fetichiza. A penitência cobiça. E você? E eu? De que se alimentam os sonhos dessas crianças?

     Era meia noite. Hora de balconista fechar o estabelecimento em que cresceu e encerrar a tripla jornada. Afinal, da balconista, levanta diariamente às 05h30 uma professora.  É hora: Levantar os olhos. Disfarçar as lágrimas. Elaborar o luto deste pecado sem culpa, crime sem réu, assassinatos invisíveis. (E eu?) Sou a formiga. Me arrepio e me encolho diante do Halloween Social, mas com a real resistência de formiga. Luto, bravamente. Não me rendo. Não vou salvar a pátria com o giz na mão, mas tenho no coração o alívio de não esperar passivamente por um mundo melhor, e sim, trabalhar pra construí-lo num olhar juvenil. Faço o que posso. E você? Tem a honra de fazer parte do romântico desclassificado e utópico “trabalho de formiguinha”?

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**Chinaira Raiazac**


SONHO DESNUTRIDO – PARTE II

Tóxico!

Você chama de amor.
Põe numa gaveta e ama a sós.
Respire!

Você diz amor,
Pra classificar o colapso
Deste ego faminto.
Respire!

Querido,
Bagunçamos chronos e kairos
E ainda não desci do seu pedestal.
Tire-me daqui, pois é preciso respirar.
Se nunca subi neste absconso pedestal,
Por que não me deixa descer?
Respire!

Você chama de amor.
Põe numa gaveta mofada e ama a sós.
Diz ser amor,
Pra classificar o colapso deste ego faminto.
Quantas vezes vai se perturbar,
Com suas imagos construídas em ferrugem e miopia?
Quantas vezes vai perder o ar, sentir perigar o peito estourar?
Embolar os diafragmas numa epopeia mental?
Quantas vezes seus olhos fundos vão me atravessar mortiferamente?
Respire!

Vociferar,
Atormentar,
Atropelar,
Palpitar.
Sufocar!

Que ânsia!
Ganância,
Vigilância,
Petulância,
Redundância!

Quantas intrépidas denúncias são necessárias,
Para que seus diafragmas mentais possam respirar?
Você chama solitária ferrugem de amor.
Põe numa gaveta e ama, tóxico e intenso, a sós.
Caminhe.
Reme.
Desintoxique-se.
Respire!

**Chinaira Raiazac**

 

 

SÓBRIA

Senhora,

De tudo cansa, de nada goza.

Murmura sozinha pelos mudos cantos cinzas,

Ansiando que não se vá o tempo do qual não dispõe.

Jovem senhora, cansada a engolir as horas,

Venerar o tempo, estudar os fatos,

Depressa se embebeda de si própria.

Jovem senhora, mais parca, menos donzela.

Menos saudável, mais fúnebre. Sóbria demais.

Mais parca, mais porca, mais perda.

De tudo cansa, de nada goza!

Madruga ao labor, a cada ano acompanhada de mais opaco sabor.

Morna! Pobre, ranzinza, rabugenta e brochada. Inapetente deste universo.

Morre dentro de si, travando guerras fantasmagóricas com amores alheios.

Amores aos quais felizmente ainda se doa e se dói,

Mas bem sabe serem das próximas, nunca seus – mesmo a sois.

Cada vez mais efêmero o rito da esparsa e mirabolante conquista,

Tal como estrelas cadentes, mágicas como ejaculação precoce.

Uma louca velha, quieta, muda a se questionar,

Quanto tempo seria preciso para esquecer-se,

De que vira um maldito roedor em sua caótica cozinha?

Jovem senhora,

Sóbria! De tudo cansa, de nada goza.

Sempre grávida de seu destino,

Sempre exalando o odor – agora fétido – do nascituro,

Torturando o presente em nome d’um grande futuro, ou gran’ finalle?

Perdera o tesão pelos próprios entorpecentes, pobre diabo-criatura.

Cansa-se, com preguiça daquelas grandes masturbações mentais.

Jovem senhora, sempre só, sempre acompanhada em multidões,

Cada vez menos orgástica e mais engajada. Sóbria demais.

alma sobrea

**Chinaira Raiazac**

 

Imprestável!

         Acordou absorto e meditabundo. Estava numa fétida e afastada rua inebriada de diversos odores humanos. Suas vestes estavam rasgadas e perturbadas tal como sua face imunda. Moscas lhe beijavam o corpo. Moscas lhe cantarolavam em graves timbres a miséria ao pé do ouvido. Desejou papel e caneta para escrever. Escrever o que o afogava por dentro. No mais recôndito do âmago da complexidade de seu ser. Queria regurgitar seus escombros, dar à luz ao caos que havia cravado dentro de si. Ou mesmo, apenas registrar desordem. Levantou-se esbarrando em garrafas, seringas e o que se pudera. Abandonou a avermelhada rua deserta. Rubra como sangue. Poderia ser o alvorecer menstruado ou o próprio inferno em chamas. Ou ainda, talvez somente seus delírios inóspitos aproveitando para caçoar de sua embriaguez.
     Caminhou. Sentou-se em frente à uma longínqua padaria, numa larga calçada já na cidade. Olhares moralizantes o atravessavam como escória da sociedade. Vá lá, ele não se importava com aqueles narizes empinados, consumidores de jornais pagos e bebidas diurnas que poderiam nascer num lar, com menor custo e mais sabor. Olhares que, ao contrário dele, dispunham de moradia para descansar o esqueleto, tal como uma casa, aparentemente não um lar. Observava a tudo. Ouviu o noticiário pelo som advindo de uma moderna-magrela TV: Um homem morrera na construção. Olhou para baixo e silenciou seus pensamentos. Viu através de um espelho, onde pousava uma mosca, que a jovem repórter sorria para as notícias da sequência que retratavam as festividades do carnaval brasileiro, bem como a competição de fotos de poodles e suas madames. A propaganda do refrigerante era mais longa do que os dez segundos dedicados a pôr fim a existência daquele trabalhador. Bebeu de angústia brindando a sós e em pensamento pela petrificação humana. Saiu enquanto eram anunciados os números dos jogos e aos múrmuros e reclames dos homens ali presentes, aparentemente jogadores e que faziam aquilo parecer um evento dedicado àqueles que só se percebem como gente, caso sejam agraciados com quantias bravas de dinheiro. Gente que atribui apequenidades e valor à própria efêmera existência.
      Apanhou uma bituca não identificada e tentava qualquer chama que pudesse ser emprestada a acendê-la.  Ao atravessar a rua, fora atingido de raspão lacônico por um carro cujo motorista murmurava o quanto seu precioso-escravo-dia seria afetado, se atingisse uma escória que não sabe existir por não se enquadrar no sistema pelo qual o motorista alimenta seus filhos. Perambulou pelas ruas. Carros buzinantes na falta de trânsito, pedestres com olhares petrificados com seus aparelhos portáteis, audições penetradas de fones, crianças que torciam e tapavam seus narizes ao notar seu cheiro, escravos engravatados, pessoas que não o viam era a grande maioria. Os que o viam dividiam-se entre ignorar e proteger seus preciosos pertences materiais. Pensou consigo: “Droga, estou ficando lúcido cada vez mais depressa”.
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*Chinaira Raiazac*

Super Lua!

Fenômeno raro,

Paixão desenfreada,

Espelho lascivo,

Luz apagada.

Cicatriz insensível,

Alma gelada.

Abraço inflamável,

Velada pele tocada.

Coração no pedestal,

Lábios, num carnaval.

Carnaval?

Carna (aval), carnal.

Verão e despretensão, paixão e café.

Nós, Cerveja! Você veja, como, (é).

Os sonhados patins, só agora, próximo aos meus pés.

Mestre dos disfarces,

Disfarces de um mestre,

Numa praça afastada,

O nada e o tudo acontecem.

Sob um tapete, o calçado 33,

Jogado, num quarto 33,

A ensaiar um encontro em 2033,

Vive de eclipse, super lua, num susto de 3.

É tempo de eclipse, apogeu e super lua!

Quem sabe na gastronomia,

Minha e tua,

O sol no apogeu não beija a lua?

super lua moon 2014 cheia grande (Copy)

                                               Chinaira Raiazac

Cronologia Sinfônica

Amizade.

Presença.

Sucesso.

Êxito.

Comemoração.

Saudade.

Vinho.

Euforia.

Vinho.

Excitação.

Desejo.

Vinho.

Concessão.

Fracasso.

Erro.

Bondade.

Vinho.

Acidente.

Troca.

Vinho.

Prudência.

Investimento.

Insistência.

Lealdade.

Orgulho.

Fidelidade.

Choro.

Invasão.

Pensamentos.

Inferno.

Aprendizagem.

Sangue, olhar e útero.

Com,

Que,

Cara?

Domingo.

Chuva.

Excesso.

Vazio.

Frio.

Dor.

Pedaços

**Chinaira**

Escr’ostra!

Num guenzo chão de terra,

Esvai-se e brota vida.

Desmaia o prurido,

Nasce tossegosa a apatia.

´

Um brinde ao aprendiz retorno,

Deserto, inóspito, conspirante,

De frouxa essência desmilinguida.

´

Às vezes parece rara visita,

Mas é apenas vento,

Atraente, jovem, iludente,

Barulhento, por trás da poeira quiçá envelhecida.

´

Feito ostra, boba,

Gesta pérolas ao vasculhar passados.

Hermética sob superlua,

Recorda as prestes e preces do chimpar

´

Guenzo chão de terra,

Retorna ao inóspito.

No refúgio do silêncio, do ósseo.

´

Guenzo chão de terra,

Numa pequena mundo-esquina,

Beijou quem beijou,

Uma boca que ensinou.

´

Script-Ostra confuta,

Lucrou e perdeu,

Venceu e abdicou  madrugadas.

Ostra confuta,

Torna ao script, gesta silêncio,

Quiçá trancada.

´Chinaira

                                         *Chinaira Raiazac*

MARÍLIA

Marília é uma boneca criada por Gepeto.

Mas poucas pessoas ouviram falar sobre seu nome.

Afinal a era machista deixou o foco em Pinocchio.

Enfim, nos ocupemos finalmente da história de Marília.

Marília é pequena, ou estatura média. Ou alta se você preferir.

Marília tem o tipo físico que se possa imaginar.

Tem os olhos e o cabelo da cor que se quisera.

Mas uma coisa é certa,

Marília é uma ninfeta!

Marília é esperta, sensível e corajosa.

Gepeto propositalmente a fez cheia de falhas e defeitos.

Um deles é pensar demais: Óh, como pensas, Marília!

Gepeto a fez com meio cérebro feminino,

E meio cérebro masculino.

Tal feito confere à Marília uma gama de extremidades,

Além de uma personalidade ímpar.

É bruta e delicada, é sensível e durona.

Romântica e áspera. Protetora e frágil.

Diabos, Marília é democrática, claro.

Afinal, transita pelos gêneros e tudo lhe interessa.

Mais defeitos: Marília adoece e chora facilmente.

Marília sangra todo mês.

Marília tem insônia e ama café.

Marília cultiva discos velhos e por vezes fuma como chaminé.

Ah, claro! Como se não bastasse,

Marília tem distúrbios sexuais.

Gepeto percebeu que exagerou em sua criação e,

Para reparar seu erro, cuidou para que Marília tivesse mais um cordão.

Trata-se de um cordão bastante específico. É interno.

Este liga três sistemas de seu corpo: nervoso, cardíaco e reprodutor genital.

Ou cérebro, vagina e coração, se preferir.

Gepeto achou que essa era a única forma de remediar sua falha:

Prevenir a possibilidade de uma sexualidade exacerbada.

Gepeto acertou na mosca!

Marília é bastante resguardada. Demais até.

Isto culmina que Marília não escolhe pela razão,

Nem pela emoção, tampouco pelo sexo.

Marília só escolhe com a cabeça, vagina e coração,

Simultaneamente.

Se Marília estiver enamorada é capaz de ter 7 orgasmos num só dia.

Mas se nada se conecta, se tranca por anos.

Efeitos colaterais: Marília tornou-se um vulcão em erupção.

Ela estuda sucumbir a desejos e romper seus cordões.

dollmariliapedacospermitidos

Chinaira Raiazac

CECÍLIA

Cecília é uma mulher encantadora.

Admira filmes, mas está em vasto débito com seu lado cinéfilo.

É cozinheira de mão cheia, no entanto não tem cozinha em casa.

Ama floricultura, entretanto quase não tem acesso às flores.

Vislumbra todo o mundo aquático, contudo jamais se atreveu a nadar.

Fascina-se com peixes, mas acha crime ter aquários pequenos em casa.

Cecília ama dançar e cantar. Mas prefere fazer isso a sós.

É amante quase nata de vinhos. Todavia seu conhecimento é rudimentar.

Cecília extasia-se com teatro. Mas foi apenas três vezes.

Cecília almeja os domingos com cinema ou parque e bicicleta.

Mas não sabe pedalar e é necessária no balcão.

Aliás, Cecília é uma atriz. Ela está ótima!

Talvez fuja do romance, como diabo foge da cruz.

Aliás, de relacionamentos.

Por vezes se pega a lobrigar companhia, mas desiste fácil.

Cecília é uma daquelas flores das mais raras. Tal como as rosas negras de Halfeti.

Funde sedução e inocência.

Tradicionalismo e modernidade.

Céu, Terra e mar. Tudo e Nada.

Entende bem as peculiaridades humanas. Afinal, é especialista da área.

Entretanto, condena em silêncio muitas “apequenidades”.

Pede a Deus todos os dias que te livre do convencional rotineiro hábito feminino:

A benção de muitas, a cozinha, o fogão, a casa, marido e filhinhos. Blah!

Costuma dizer que não é barriga-de-aluguel, a fim de ser enxergada em sua totalidade.

Não que tudo isso não sejam bênçãos. Afinal Cecília tem suas pitadinhas de inveja.

É que Cecília sonha alto, sem medo de cair.

Cecília espera mais dessa vida.

Talvez uma volta ao mundo fosse equivalente ao menor de seus apetites.

Pobre Cecília, num mundo de panelas bem e mal tampadas é frigid (eira).

Cuidado! Ela é capaz de espirrar gordura em quem não souber se aproximar.

Os mais aclamados vídeos de pedidos de casamentos lhe parecem medianos; cômodos.

Cecília ama animais. Cecília ama ler. Cecília ama X. Cecília ama Y. Cecília ama Z.

Cecília ama. Cecília ama. É de poucos amores e de nenhum.

Cecília isso e aquilo. Mas, se, contudo, porém, entretanto, todavia…

Acho que você já percebeu que,

Um dos problemas de Cecília é o desiquilíbrio entre teoria e prática.

Cecília é um balão, se não for trazida a Terra, voa e viaja em suas ideias.

Mesmo com tudo isso, sempre foi segura de si.

Nunca se deixou abalar pelas falácias: Cecília precisa sair. Cecília precisa arranjar namorado. Cecília precisa ir ao ginecologista. Cecília precisa descobrir seu tipo sanguíneo. Cecília precisa comprar. Cecília precisa fotografar. Cecília precisa postar. Cecília precisa transar. Cecília precisa escrever de outro jeito. Cecília precisa acostumar. Cecília precisa parar de estudar. Cecília precisa. Cecília precisa. Cecília precisa…

Não! Cecília ama, lembra?

Cecília não precisa. Cecília não quer precisar.

Pra Cecília, nem a matemática é precisa.

Cecília não pode se enquadrar.

Aliás, Cecília adoece, só de pensar em se enquadrar.

Cecília adoeceria se passasse o período comercial atrás de um computador empresarial.

Imagine Ceciliar num escritório das 8h00 ás 17h00, depois Ceciliar até o caminho de casa num congestionamento.

Imagine Cecília sem ver o sol. É incabível.

Cecília não se vendeu a isso.

Cecília aceitou um café. Talvez por desencargo de consciência.

Não havia nada de errado com Asafe. Além de ser a cruz do diabo, claro.

Aliás, Asafe é um homem em extinção.

Talvez seja a personificação de idealizações adolescentes e até mais maduras.

É do tipo que carrega a bolsa, puxa a cadeira e tira o casaco da moça.

Cecília nunca viu isso antes. Obviamente se deixou surpreender.

Asafe é extremamente educado. Era um café, mas surpreendeu com teatro.

Asafe a atravessava com seus olhos verdes. Talvez tenha se encantado com Cecília.

Asafe tem uma embalagem bem bonita, como uma produção hollywoodiana.

E se comporta como ator galã daqueles distantes filmes românticos.

Asafe também é bonito por dentro. É de humildade e simplicidade encantadoras.

Mas, Asafe foi mais que cruz.

Em menos de 24 horas ejaculou sua necessidade de um relacionamento a dois.

Cecília queria um café, Asafe procura uma mulher.

Foi mal Asafe. Passar bem.

cecília

                                                  **Chinaira Raiazac**

ÁGUAS EM MIM

Sou cachoeira, inquieta, de pensamentos.

Sou também grande rio de doces sensações.

Em mim, há mar, cujas ondas temperadas de sal,

Movimentam-se inteligentemente de acordo com a música do vento.

Sou um poço profundo que pode matar sedes profundas.

Por vezes sou a seca, ansiando a própria chuva selvagem, divina.

Sou mina, abundante, pura, impura, doce, rara.

Posso também ser pequena, como um balde de água fria.

Sou gélida cascata, virgem, inexplorada.

Sou um lago frutífero, habitada por peixes quase sempre necessitados e famintos.

Sou vasta como um oceano, que – pacífico – não aceito a pequenez humana.

Sou chafariz, proativa, anciã, experiente, levemente rude.

Sou gruta, indisponível, inabitável, impenetrável, apreciadora do silêncio.

Sou uma fonte, de ceticismo, ações, angústias e comemorações.

Sou sucinta, direta, objetiva e relativamente acessível como um copo d’água.

Porém sou igualmente inalcançável como gota de orvalho no deserto.

Sobretudo, sou o âmago da sede em mim.

waterinmechinaira

Chinaira Raiazac

É tarde!

Agora é tarde,

É tarde pra me apaixonar docemente,

É tarde pra beijar lentamente.

Tarde.

É tarde pra idealizar,

É tarde pra ser menina.

Menina, adolescente ou tola cantarolante.

Anos amargos,

Roubaram de mim o otimismo,

A doçura a dois, ou a cegueira tão boa,

Sonhos encantados são poeira.

Estive num lago, com sapos.

Agora estou amarga, fria e realista, intocável.

Anos esclarecedores.

Agora é tarde,

Tarde demais,

Para sentir borboletas no estômago,

É tarde pra esperar uma ligação,

Flores, bilhetes, declarações,

Pedidos excepcionais, surpresas ou bombons.

Agora é tarde.

É tarde pra não sentir tédio.

É tarde pra ter paciência ao rito da conquista.

É tarde.

Tarde pra mostrar meus melhores pedaços.

É tarde pro rito dos olhares.

É tarde agora.

É tarde para tentar.

É tarde pra querer.

É tarde pr’aquele piquenique,

Pr’aquele passeio de bike no parque.

Pr’aquelas viagens, simbólicas e concretas.

Pr’o circo com pipoca e algodão doce.

É tarde pra deitar na grama,

E me pôr a pensar em romance.

É tarde pra me pôr a observar estrelas,

Estrelando lábios.

No mundo das panelas me sinto frigid(eira).

Agora é tarde.

Devo me aposentar.

É tarde e só quero descansar.

É tarde.

Tarde pra ser menina.

Tarde pra ser tola cantarolante.

Que saudades do meu tempo de tola.

O tolo tempo de agora vestiu em mim um colete,

À prova daquilo.

Agora sou outro tipo de tola.

Tarde

**Chinaira Raiazac**

Can-saço!

De cansaço,
Eu vou sumir por aí,
Me pôr à
Engolir livros,
Matar fantasmas,
Paquerar insetos,
Beber vinho em excesso,
Implantar um chip,
Ficar roxa de raiva,
Escrever mais besteiras,
Ou só, sumir, mesmo.

CAN-SAÇO.

**Chinaira Raiazac**

Homizio de Agora!

Mulher insana,

Toma a inici (ativa).

Aparece do nada e a isca é mordida.

Depois é largada, que história atrevida.

—–

Costumava ser ardil a sós.

Costumava venerar o caos,

Fleumático.

—–

Costumava a não acostumar.

Hoje bebe a balbúrdia,

Brindando, pra lá e pra cá.

—–

Antes bebia,

Frugal sentimento, que parecia incólume.

Hoje leva a balbúrdia,

Na mochila,

A ruar a sós.

—–

Ruar a sós?!

Tu não,

Eu! Claro!

Que bom!

—–

Estrela cadente,

Nasce, pachorrenta.

Deslancha e morre frenética.

Morte súbita, seu martírio.

Seu martírio, seu homizio.

Encanta, esquenta,

Queima e foge da gente.

—–

É pérfido.

Pérfido e burro,

Da distância que adoeço,

Dela também me curo.

—–

O Brasil aqui e o México pra lá.

“Musa brazuca” não mais a encantar,

Covarde a tergiversar.

—–

Tenho me matado,

De tanta saudade a engodar.

Tenho me matado, de muito expectar.

Fui loquaz e belicosa, antes de ir embora.

—–

Hey musa,

Se desliga!

Dessa história,

Pois não vai rolar.

—–

Bazuca,

Não se liga, nesta história,

Pois parece mais forte,

O medo de dilapidar.

—–

Hey!

Louca,

Estás tu a duvidar?

Solla Miente!

homizio

*Chinaira Raiazac*

Nariz de Palhaça!

Abra a cortina:

Nariz de palhaça,

Mulata gelada,

Não beba cachaça,

O amarelo é de graça!

————————

Feche a cortina!

Nariz de palhaça,

Gelada mulata,

Engula a cachaça,

Teu amarelo não foi de graça!

Nariz de Palhaça!

            Chinaira Raiazac

Show Gelado!

No escuro, 

4 Paredes úmidas,

1 espelho suado.

No escuro, 

A porta molhada, 

O basculante embaçado.

Era o escuro, o enamorado. 

Um palco bafiento é improvisado.

No escuro,

O frasco de shampoo, um microfone emprestado.

Tudo era belo, nu  – e – molhado,

No escuro o frenético show era gelado.

Show Gelado

                         Chinaira Raiazac

Ctrl + c + Ctrl + v do meu facebook!

UMA REFLEXÃO SOBRE RELACIONAMENTOS!

Você já parou pra se perguntar as razões das dificuldades de se relacionar com alguém? Você é o tipo de pessoa que repete sem pensar que “no começo é tudo lindo?” Se for, reflita! Você já parou pra prestar atenção no fato de que a maioria das letras musicais refletem os relacionamentos afetivos a dois?
Ao que me parece, independentemente da época, ou do estilo musical, a humanidade, depois da música, sempre usou bem esta forma de expressão. Seja pelos compositores da música clássica do século XV, apaixonados ao piano, pelos registros de serenatas ao luar, ou mesmo nossos cantores contemporâneos da música brasileira que são ridicularizados por outras classes ou subjetividades sociais, talvez por trazer de forma vívida, crua e até pouco elaborada, as sensações mais primitivas das dificuldades e desejos de se relacionar.
Falando em desejos, você é o tipo de pessoa que deseja além das possibilidades? Isto é, seus desejos são mais importantes do que o outro pode oferecer? Você idealiza este outro, ou se empenha para enxergá-lo como tal? Você é o tipo de pessoa que atribui sua felicidade a outrem? Isto é, que responsabilidade uma pessoa teria por achar que deve – a todo custo- fazer a outra feliz, até porque, claro, ela é infeliz consigo própria. Pára e pensa, não seria mais digno você se responsabilizar pela sua felicidade? Não atribuir ao outro o fardo de “ter que te completar”? Complete-se por si próprio (a). Assim, a companhia desta pessoa que você ama, gosta, ou aprecia, não lhe seria tão frustrante ou de grandes expectativas. Como diria Jô Soares: “A melhor maneira de ser feliz com alguém é aprender a ser feliz sozinho. Daí a companhia será questão de escolha e não de necessidade.”
Pois bem, e pensando em tudo isso, em seus desejos e suas idealizações, já parou pra pensar em pessoas? Eu falo de PESSOAS. Não aquilo que você vê na TV, nas novelas, nos filmes, nos comerciais, nos livros, na mídia em geral. O quê? Vai me dizer que você baseia sua vida e seus desejos nesta imagem social deturpada que te vendem? O homem é um príncipe, galã de novela, que te leva flores, café da manhã na cama, lembra das datas, paga as suas contas, não tem chulé, mau-hálito, repara no seu esmalte, (Porque como mulher real você está com as unhas em dia, 24 horas por dia, certo?), entre outras coisas. Na verdade tem uma lista delas que tenho preguiça de pensar. Se você acredita nesta imagem social de masculinidade romântica, deixa eu te dizer uma coisa, você é hétero boba, um bi ou gay bobo! Além de folgado (a).
Primeiro porque eu propus pra pensarmos em pessoas reais. Segundo, que assim haverá menos probabilidades de você ser feliz, procurando uma imagem perfeita de homem. Cá pra nós, perfeita uma ova. Não te brocharia saber que o cara não tem defeitos? Que parece um boneco de fantoche ou robô seguindo o script da sua cabeça, sem personalidade própria? Espero que sim.
Agora a imagem social da mulher: Gostosa! Gostosa! Gostosa!
Longe de ser feminista, embora aprecie parte dos princípios, eu diria que é mais complexo discutir a imagem social feminina.
Primeiro pelo fato de que vivemos numa sociedade imediatista. Ou seja, tudo é pro aqui e pro agora. E por favor, sem aquele papo de antigamente… pára! Antigamente era antigamente. E provavelmente a maioria dos leitores do meu facebook nem tem idade pra falar de “antigamente”. Afinal o que nos ensinam a fazer, o tempo todo, é repetir esse ou aquele discurso sem pensar sobre ele, então, se você não viveu no “antigamente”, guarde seus registros do que ouviu, mas não use isso pra sua vida. Pode ser que hoje poucos dos casamentos dure. Mas os casamentos das antigas duravam mais? Por que havia mais amor? Mais dinheiro? Mais submissão? (feminina ou masculina); ou talvez por serem, a grande maioria, arranjados? Bom, eu já disse, esquece o “antigamente”.
Voltando ao imediatista, quem assistiu ao documentário “A história das coisas”, sabe de que imediatismo estou falando. Mas traduzindo aquilo tudo pras relações humanas. Eu diria que as pessoas são quase que incapazes de ter noções futuristas, ou de imaginar as coisas a longo prazo. Sério! É tudo “pro aqui e agora”.
E provavelmente se você, está com alguém que te enxerga nas lentes imediatistas, tem maiores possibilidades de ser descartado (a). Afinal, as EMBALAGENS são descartadas. Já o CONTEÚDO, se for bom… pode ser que dure e suporte a passagem dos anos. Antes de começarmos a discutir sobre a mulher, pense nisso, você cultiva ou investe mais em seu conteúdo ou sua embalagem? Você procura mais conteúdo ou embalagem nas pessoas?
Te desejo a sorte de se apaixonar por alguém que reúna os dois componentes que te agrade. Mas gostaria que se livrasse o quanto antes desse seu jeito de admirar (demais) mulher que só sabe cultivar a embalagem. Provavelmente esta boneca deve ser uma gracinha e provavelmente estará sempre bem maquiada, pode dançar bem, mas e depois? Que futuro pode te oferecer uma pessoa que só investe na EMBALAGEM? O que sobra depois dos anos? Eu te digo: Uma Gretchen da vida, e que Deus te livre e esta me desculpe. Que Deus te livre de um homem que parece um triângulo do lado errado desfilando pelo corredor da academia exibindo seu cérebro no bíceps. Este também gosta de investir mais na EMBALAGEM. Provavelmente te verá como uma mulher fácil que se derreterá por um pedaço de metal, digo, um carro e rirá com os amigos na balada ostentando com whisky barato ao falar da gravidez como o mal masculino. Mas você não deve ser vista(o) assim, não é? Ou deve?
Pois bem, voltemos a falar sobre a imagem da mulher. É simples, se quiser viver com um homem que tem o cérebro no bíceps e que tem horror a ser pai um dia, seja gostosa! Uma delícia. Você não precisa ser inteligente, não mesmo. Não pense em faculdade, mestrado, doutorado, ou qualquer academia intelectual. Isso é pra gente feia. Você é bela demais pra estudar. Talvez possa usar os livros pra fazer exercícios de bíceps, tríceps, etc. Só precisa de roupas, maquiagens e sapatos, linda!
Ah, eu já ia me esquecendo: Se seguir este raciocínio, não te esqueças que o tempo passa. Você pode até arrumar um marido que reconheça sua bela EMBALAGEM. Mas não se esqueça que depois tudo isso passa. Você pode ter filhos, mas isso vai estragar sua EMBALAGEM. A amamentação vai ferir teus belos seios, alargar tua vagina perfeita, dentre outras lástimas. Ops, cadê seu maridinho? Óh não! Está ali com uma garota com a metade da sua idade. É provavelmente uma cópia sua de 20 anos atrás. Outra Fernanda, Maria, Gabriela, Carmen (…) que não soube escolher um homem de CONTEÚDO, pois afinal, tudo que ela também tinha pra oferecer era EMBALAGEM.
No geral, a dificuldade no lado da mulher, além de se achar boa o bastante, ou, no outro extremo não se valorizar o bastante, é que estará sempre em meio aos idiotas, machistas ou insuficientes pra ela. Mas talvez nunca seja reflexiva o bastante pra se perguntar as razões de trabalhar fora e ainda ter que sozinha cuidar da casa. Vivo repreendendo amigas casadas “Fulano lavou a louça PRA MIM, ontem”. Óh que coisa mais linda! Que prova de amor. A louça era sua! O papel de lavá-la era seu, apenas seu, certo? Talvez por isso seus olhos brilhem quando ele faz isso POR VOCÊ! Credo! Vamos acordar mulherada!
Bem, no geral, falando em amigas, e pra finalizar este texto, foram elas quem me inspiraram a escrever sobre relacionamentos. Relacionamentos humanos são difíceis mesmo. A dois então, uh! Mas isso pode ser agravado se você esperar demais e oferecer de menos. E oferecer o que acha que o outro quer, sem se perguntar o que de fato é.
Primeiro esqueça a imagem de príncipe que você aprendeu na Walt Disney, e esqueça a imagem de ninfomaníaca que você aprendeu nas revistas ou nos filmes que… bem, esqueça! Estamos falando de pessoas reais. E as famílias reais têm problemas. Os relacionamentos têm problemas. Conflitos e etc. Mas se há amor e dedicação de verdade, e menos miopia, as pessoas podem se ver mais e se atacar menos. Por isso, amigas que vieram me falar sobre o quanto brigam com o namorado, antes de achar que deve terminar com aquele parceiro, se pergunte se tem se dedicado em seu máximo, antes de cobrar isso dele. Se o ama, saiba que não há errados na história. Ambos estão corretos de tentar adaptar seus gostos, desejos e vontades em um só coração. Depois de ler isso, beije seu amor como nunca. Mas se não o ama, busque sua real felicidade. Você procura conteúdo ou embalagem?
CHINAIRA RAIAZAC!

“Nietzsche disse que só existe uma pergunta a ser feita quando se pretende casar: “continuarei a ter prazer em conversar com esta pessoa daqui a 30 anos?.”
― Rubem Alvez

Under Pressure!

Mais café.

Menos favores.

Mais amigos.

Menos colegas.

Mais amor.

Menos conflitos.

Mais compreensão.

Menos justificativas.

Mais café.

Menos sono.

Mais relógio.

Menos tempo.

Mais coragem.

Menos broquel.

Mais produção.

Menos rancor.

Menos café.

Mais sabor.

Menos colegas.

Mais amor.

Under Pressure!

*Niarachi Raiazzac*

Bailarina Torta!

Não mais houve pulmões nefandos,

Ao aurorar da engenharia de ideias.

Fizeram de mim e do meu velado silêncio,

A melhor das possíveis plateias.

Na surdina da madrugada,

O crepúsculo enfrenta com bravura o negrume do mar.

Nesta temporada de shows e horrores,

Sou bailarina meio torta, mas ainda sei dançar.

Espetáculo em garbo, pra inglês ver ?

Sem negar o rock, vou aprender a sambar e sobreviver.

Meu amor eu amo quase em segredo,

Todo mundo sabe, mas ninguém realmente vê.

E é só dentro de mim,

Que eu verdadeiramente me declaro a você.

Ando sonolenta, mas depressa irei acordar.

Até lá, vejamos uma bailarina torta, dançando à beira do mar.

Mal-amada, bem-amada! Não deve importar.

É uma aprendiz, e ainda que torta, tem gozo ao sambar.

Bailarina Torta

Niarachi Raiazac

https://www.youtube.com/watch?v=LOSfG9ADmfo 

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Soul Coffee

Embriagarei de cafeína,

Minh’ alma em velha esquina.

Para que não me abandone desta vez,

Minha hóspede Luci-dez.  

Pedaços Permitidos
Pedaços Permitidos

Niarachi Raiazac

Vidraça Abstêmia

Veja esta vidraça!
Linda e não temperada.
Veja a vidraça,
De transparente está abandonada.
Ah, a vidraça!
Passa pelas 4 estações sem ser empoeirada.
De perto, a vidraça,
Tem uma lasquinha bem ousada.
Quebraram a vidraça,
E fugiram como se não tivessem feito nada!

vidraça abstêmia

Niarachi Raiazac

Homem de Terra, Mulher de Mar

Viajastes a sete mares,

Sem verdadeiramente nada a procurar.

Prosseguia como bom boêmio,

Oscilando entre o tédio e alguma diversão a vagar.

Mistério, sangue frio, terra e mar veio a calhar.

Maldita! Bendita seja. Curiosa e (im) perfeita, sereia fostes encontrar.

Maldita, com sede e ousadia em seu barco foi pular.

Bendita, atendeu-os e teus lábios foi beijar.

Imperfeita, tocou seu coração, ao dela lhe entregar.

Tamanha beleza, senhor mar, proveu sonhos e sonhos a jorrar!

Homem de terra, mostra vida pra mulher de mar.

Não se engane, doce homem! Covarde sereia não aprende a andar.

Não se engane, doce homem! Um dia, os lábios dela tu há de rejeitar.

Sensato homem, teu barco agora velho, está na tempestade em alto mar.

Cansa, cansa! Óh, homem de terra, como é difícil amar no mar.

Fuja, fuja! Óh, homem de terra. Salve teu orgulho destas águas a dançar.

Fuja orgulhoso e descubra, surdo não és, pois as desgraças dela podes escutar.

Fuja, maldito homem! Não és domador de sereia. Valeria arriscar?

Homem de terra, não insista,

Uma vez que admitistes que teu suposto amor começa a se esgotar.

Anda, anda homem de terra! Se não queres aprender a nadar.

Salve teu precioso coração e devolva o de pedra a este mar.

Por Deus, cala-te! Por amor e teimosia, não cesse teu remar.

Compreenda, somente homem surdo ensina sereia a andar.

Aprenda! Sereia que nasce em água turbulenta, tem um jeito diferente de amar.

Homem de Terra, Mulher de Mar.

Niarachi Raiazzac

RELATÓRIO DE GESTÃO INTERPESSOAL

E então, há um semestre eu demiti meu psicoterapeuta.
Dei férias definitivas pra minha ex-muito-amiga, que não mais voltou.
Esta semana paguei a última parcela do seguro dex-namorado, ao próprio.
Aliás, estou cortando gastos! E como esta vaga é, por hora desnecessária,
O departamento responsável interviu pela anulação indefinida de qualquer iniciativa.

Enquanto viajei ao exterior (de mim), houve um curto processo seletivo desorganizado.
De todo modo, a seção responsável reduz que, nenhum dos candidatos se adaptou ao clima organizacional proposto pela vigente coordenadoria.
No entanto, como membra exclusiva da diretoria deste departamento, ao retornar de viagem (endógena), anulei todos os processos em andamento: É preciso cortar gastos!

Em determinada pauta da reunião dos EUS,
Decidimos, por unanimidade, aumentar a produção dos setores comerciais.
Aceleramos os cronogramas anuais em vias de alteração nos percentuais produtivos. Empreendemos que uma empresa recém-formada demanda destaque comercial.
O objetivo maior é stricto sensu. No entanto, como este é um projeto nascituro,
A rota delineia-se seguindo o trajeto coorporativo lato sensu desde fevereiro deste ano.

O planejamento é bem feito! Os gráficos das planilhas são promissores.
Promissores gráficos, ações focalizadas, promissores lucros, ainda que não próprios.
Eu, por motivos complexos, aprovo esta mobilização da proponente iniciativa administrativa, sem qualquer recolhimento de assinaturas de outros departamentos alheios a esta gestão interpessoal. “Travailler”, “ouvrer”!

Nas ações como própria proponente, contratei a amostragem de aulas assistenciais de um futuro projeto de maestria. O setor de gestão acadêmica empreende que, com este investimento, os lucros já aumentam significativamente na esfera subjetiva, ainda que por um prazo de tempo indeterminado. Além destes investimentos, o departamento conta com a iniciativa docente na esfera estadual, de modo a aguardar parcerias estrangeiras.

Representantes empresariais das seções de políticas de lazer e saúde também registraram suas mobilizações em busca de melhorias. Recentemente houve queda brusca e intensa na produção de plaquetas e leucócitos […]. A imprensa não divulgou quais ações metodológicas seriam executadas em prol da mudança deste cenário.
Sabe-se apenas que esta comissão conta com a iniciativa de autocuidado, com implementação de políticas que viabilizem o aumento percentual na taxa de sorrisos.

Relatório de Gestão Interpessoal

**Niarachi Girl**

 

Elisabeth Bishop dizia que, a arte de perder, não é nada sério.

Dizia ela que, nada disso – nada – não seria nenhum mistério.

Entre sérios e mistérios, se fundem e se ciscam, opostos hemisférios.

Dos errôneos significados do AMOR nos dicionários alienados,

Me parti entre lá e aqui. Deleitei-me ao vento. Como e com múmias,

Vi o nada em lugar algum.  Falavam sobre tudo com ninguém.

De resto a resto, o que me resta é recolher-me à junção de cacos.

Os ventos e ventanias são bem-vindos, desafio-os, perco-os, venço-os.

E assim, faz-se necessário trocar a melodia, os timbres, a música.

Os passos, os toques, a dança, que dançávamos descompassados, 

Nesta festa melancólica, te convido a ocupar o lugar onde sempre esteve.

Dancemos, juntos, tua música, afinal, nada disso é sério.

Image

    ** Niarachi Girl **

DESCARTÁVEL

           Estes dias – já faz algum tempo –  estive pensando em relacionamentos. Ou melhor, em relacionamentos amorosos. As relações humanas muito têm me afetado a observação. Fiz uma espécie de analogia. Lembrei-me de que, quando criança, tinha preguiça dos meus lápis velhos. Sabe material escolar (infantil)? A graça do novo, o cheirinho e tudo mais? Não sei vocês, mas eu, quando criança, não sabia bem como usar um caderno, de modo que eu o enchia de “orelhas” e depressa ele ficava “feio” e perdia a graça. O mesmo acontecia aos lápis – que eu mordia frequentemente –, às borrachas e todo o resto, de modo que eu não via a hora de largá-los de lado para obter um novo caderno, um novo lápis, uma nova borracha, até que eu estragava tudo e requeria novos outra vez e, tudo se tornava um círculo vicioso. Pareceram-me tão familiares às relações humanas, relativo ao alto número de divórcios, casamentos e afins.

            Usando da sinceridade e auto-honestidade, talvez possamos admitir que não seja difícil que façamos isso com as coisas. O próprio sistema assim nos molda, condiciona, “escraviza” tragicamente. Quais dos leitores ainda tem vídeo cassete e não aderiu ao DVD? Por opção? Oi? Ouvi alguém dizer “Blue Ray”? É uma nova palavra da língua portuguesa? Criado no Brasil? Bem, amanhã será mais um aparelho descartável, afinal existirá outro muito mais moderno no mercado. E PRECISAREMOS dele!

              Curioso é que esse pensamento das coisas reflete-se na relação com as pessoas. Pensar nisso, era como ouvir uma música automática e robótica, cujo nome seria “Monotonia”. Ouça o refrão: Conquiste! Procrie! “Estrague” sua relação! Divorcie-se e case-se outra vez! Repita este refrão quantas vezes forem necessárias. Como o refrão da música da “vida”. De muitas facetas, esta temática é algo peculiar às inter-subjetividades de cada sujeito. Mas veja, no geral, não parece tudo tão… Descartável? Talvez produto de uma sociedade capitalista, alienada, imediatista que intenta tudo pro aqui e agora. Se vivemos na filosofia da EMBALAGEM, tudo pode ser descartável! Como falecidos seios fartos que hoje são flácidos devido a uma amamentação corriqueira e apressada de uma mulher que precisa correr pra dar conta de “tudo”. Como uma indesejada calvície que incomoda ou ausentes ereções oriundas de preocupações responsivas. Estragará este caderno, precisará de outro, novinho e urgente! Não conseguirá tolerar esta frustração. Acionas teu meu mecanismo de fuga. Como é bom um “caderno novinho”, sem orelhas, sem amassos! Sem conflitos!

           Discussões desgastam, minam, provocam preguiça e fuga. É preciso muita clareza e coerência para discriminar pra si próprio quando se está “amassando um caderno”, ou quando se está “sendo muito amassado”. De onde vem a necessidade de trocar o cenário, ou se não se está atuando num círculo infernal. Já que no final, todo cenário parece igual? Está-se faltando paz e paciência, ou se a ansiedade e intolerância merecem maior atenção? Ter tolerância implica em esquecer-se de si? O amor é feito somente de bons pedaços? Existe uma balança que contabiliza aspectos negativos e positivos? Há tempo pra êxito quando tudo parece fadado ao fracasso? Descartar? Reciclar? 

           Existem perguntas boas de fazer ao próprio ego. É bom lembrar que uma relação é feita de mais de uma parte e assim devem ser cuidadas por ambas as partes, que não necessariamente constituiriam o todo. Uma coisa é uma coisa, uma pessoa é uma pessoa. Seria apreciável ter a consciência de que se pode escolher entre a filosofia do CONTEÚDO e da EMBALAGEM para guiar relações humanas. Para que se enxerguem pessoas cansadas ao invés de cadernos velhos. O que ocorre? Afinal, um dia, a tal coisa-pessoa fora “interessante”, despertou desejo, interesse, ou não?! É descartável? 

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**Niarachi Girl**

 

 

ANDRÓGENA

Hoje eu vou ficar quietinha, sentadinha, bonitinha.

Minha cultura me ensinou que mulheres são assim.

Enquanto cruzo as pernas, ajeito os cabelos antes de retocar o batom.
Se eu não me comportar nestes moldes, ai de mim.
P-ffffff HAHAHA! Eu me divirto com essas normas da nossa sociedade.
Cê corta pros dois lados? Como assim? Dois lados?
Credo, só duas linhas pr’esse mundo todo?
Enverga-te! Seja homem ou mulher, nada além disso! Cruzes!
Seres racionais, quando descobrirão que gênero nada tem a ver com orientação afetivo-sexual?
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**Niarachi Girl**

POBRE CLASSE MÉDIA

Espelhai-vos nas ELITES.
 
           Homogeneizei vossas subjetividades.
 
Estourem vossos limites crediários.
 
                Sacrificai-vos aos vossos bolsos e vida,
 
Em nome do falso LUXO e aparências, amém!
 
pobre-classe-mc3a9dia-ppermitidos

PANÓPTICO DEUS

Homens, vós não vedes

                               Mas sois vistos.
 
Sois bons, pois sois vigiados.
 
                         Então vigiais homens bons,
 
Pois teu panóptico deus, 
 
                                     A tudo vê e de tudo sabe.
 
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** Niarachi Girl**

DEUS É AMOR (…)

         Não classificada, minha atual superficial representação de Deus, 

Condiz com a exteriorização do BEM humano no tempo e no espaço.

 

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**Niarachi Girl**

 

HOMEOSTASE

“E sob a luz da lua, eu vos projetava duas sombras.
Uma dançante e outra imóvel.
Eu, atônita, atrevi-me a dançar.
Pois vejam as sombras, a dançante cessou, a imóvel dançou…”

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**Niarachi Girl**

 

 

 

EUSNÓS

Teu EU e meu EU, acoplados em nós,
Se dizem margem de NÓS.
Atados os nós, tu, eu, vós, nós, todos sem voz.
Teu EU penetrante de meus EUS,
Quando o faz, ja não sou, tão somente, EU.
Meus EUS, tão nossos quanto seus, já não são só meus.
O impermeável do teu EU fere quaisquer dos amores meus.
Teu isento EU, negligencia o apaixonado de meu EU.
EUS meus, aniquilados por EUS teus, esvaem-se aos breus.
E assim, NÓS dançamos sobre ladrilhos instáveis.
EUS meus suplicam a EUS teus, ainda que cegos,
Não deixem partir EUS meus.

 

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**Niarachi Girl**

QUAL QUER?

               “Em qualquer tempo, em qualquer espaço, de qualquer modo – por amor, impulso, escolha ou violência – fecunda-se, por quaisquer sujeitos de sexos biológicos opostos, um embrião qualquer. Tempos mais tarde, do embrião qualquer nasce um individuo qualquer, de sexo biológico qualquer, cujo pensamento qualquer, pratica uma ação qualquer: um suicídio qualquer”.

 

            Era a mensagem trazida no interior duma garrafa dançante na brandura dum mar qualquer. Pés descalços sobre a areia branca, olhos imersos no horizonte a enamorar o pôr do sol criticavam, largando a garrafa viajante sobre o branco da areia onde deixava seus rastros profundos:

 

                “ – Como alguém pode escolher algo assim?”

 

            Velho Fuzil que a tudo observava a distancia, aproximou-se da cena, daquela garrafa novamente solitária. Releu a mensagem que não havia sido inteiramente captada por sua desgasta audição. O fez em alto e bom tom:

 

“Em qualquer tempo, em qualquer espaço (…) um suicídio qualquer”.

 

            Agarrou pra junto de si a garrafa com a mensagem e recolhera-se a um bosque abandonado onde vivia sozinha. Do trajeto ao bosque caminhou refletindo a respeito, o que perdurou por três dias quando no bosque. Lia e relia e mergulhava em suas lembranças onde encontrava o discurso de Olhos no Horizonte: “Como alguém pode escolher algo assim?”.

            Á bem da verdade, Velho Fuzil, admiradora das naturezas, não se contentava em refletir passivamente sobre acontecimentos que muito lhe marcavam. De modo que ela deveria fornecer, de maneira concreta, uma resposta que seria acessada ou não pelo seu “elemento merecedor”, neste caso, Olhos no Horizonte, ou o próprio universo.

            No âmago de seu ser, sabia de um modo qualquer, que a resposta fomentava a si própria já que não importava-se com a existência ou inexistência de receptores alheios, visto que seu próprio ser era o receptor matriz de sua resposta.

            Devolveu a caneta ao tinteiro, laçou o papel e o introduziu no interior duma verde garrafa. Caminhou até a praia sentindo a brisa em face e alma. Na face d’alma, n’alma da face. Naquele mesmo lugar onde Olhos no Horizonte largara a garrafa viajante, Velho Fuzil deixou a verde garrafa e partiu, sem deixar rastros. Entretanto, enquanto partia, pronunciava em bom tom sua resposta qualquer a atenciosa ventania:

 

                “ Eis aqui uma resposta qualquer, mobilizada por uma questão qualquer. Um sujeito qualquer, com características quaisquer, respondeu de um modo qualquer a outra garrafa qualquer. A garrafa qualquer referia-se a um suicídio qualquer, ao qual o sujeito qualquer indagou com certo desprezo: ‘Como alguém pode escolher algo assim?’. De um modo qualquer, questionei a um EU qualquer: ‘Como alguém poderia referir-se deste modo a um suicídio qualquer?’ Qual ser quer? Qual quer? Qual quer viver? Qual quer morrer? Qualquer! Não importa! A questão é que não trata-se de uma escolha livre e sim uma qualquer. Como bem ouvi de meus EUS quaisquer: Um suicídio qualquer é uma escolha qualquer. Se nenhum dos indivíduos quaisquer têm qualquer poder sobre seu nascimento, ora, como o teriam sobre a condição nascitura de sua morte? O suicídio qualquer, de um modo qualquer, rompe com uma vida qualquer, que fora imposta de maneiras quaisquer: ‘Viva, é bom’, ‘Viva, ou tente’, ‘Viva, o contrário é covardia’, mas sempre ‘Viva, você está fadado a tal, aceite’. Esta última imposição qualquer, como um padrão qualquer, quando não acatada – sim acato – por um sujeito qualquer, pode refletir equivocadas concepções por alheios quaisquer, quem sabe um transtorno qualquer…”

 

 

           NOTA: Esta obra não está a salvo de equivocadas concepções. Este texto não defende posições sobre vida e morte, apenas convida a reflexão de situações quaisquer cujo trânsito de subjetividades quaisquer, acaba cruzando-se de um modo qualquer, culminando em equívocos quaisquer que desconsideram os envolvidos quaisquer e seus contextos quaisquer. Toda e qualquer “análise” que se preste como tal, não deve ser executada descosturada da cultura qualquer, tão menos realizada partindo de uma ótica qualquer.

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** Niarachi Girl**

 

LÁ NA NOSSA CASINHA DE BARRO

O nortedelá é o que há. As criança daqui não são tão diferente dadelá.

O homem do campo ao labor, cuida da famia cum dignidade e amor.

A muié que coamor cuzinha, as tarde proseia cas vizinha.

O homem que pranta semente, nem sempre tem os dente da frente.

E as veis na cidade, nem se sente gente.

As crianças nem sempre tem fadiga, mas vive cas lumbriga den’da barriga.

O trator que vive em cima da terra, pede a Deus que a chuva num erra.

A seca que atinge o sertão, corrói os nordestino coração.

Os cabrito que com amor nóis cria, agente come nos casório das fia.

Os pais nem sempre sabe iscrevê, mas sempre diz pros menino aprendê a lê.

Vovó dizia que queria o papai pra ser doutô, mas foi quando embuchô Maria que se estrepô.

Lá em casa tem eu mais sete irmão, nóis tudo buscandeducação.

Titia Cida vive caçando namorado, noite ou outra os santo tão tudo virado.

Sempre que nóis toca viola, a vida dus cumpadi log’miora.

Rapadura baxo do sor, é do domingo nosso mior!

Vovô ensinou Joãozinho a pescá, disse ele que é mior do que istudá.

As veiz até dá vontade de istudá, mas a roça chama pra trabaiá.

Nóis tem que andá horas de barco ou canoua, pra ir na iscola ver a fessora patroua,

Nóis faiz um esforço danado pra istudá, depois vem os paulistano criticá.

Os tio do governo foro anjo do céu, agora nóis tem água sem buscar no beleléu [ironia].

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**Niarachi Girl**

 

VELHO FUZIL

                   Velho Fuzil caminhava pelas ruas como se seus pés enojasse o solo em que pisava. Seus olhos vidravam a “luxúria” alheia, como se tivesse o direito observar e recriminar o que via. E ainda, de classificar, partindo de seus princípios, a tal “luxúria”. Sentia-se numa cena cinematográfica, sendo uma figura totalmente alheia à cena da vez. Era como se tudo acontecesse em câmera lenta. Como se visualizasse em cada face, uma alma, e em cada acontecimento, o inferno. Embriagados seminus a dormir pelas calçadas fétidas, em meio a preservativos usados, garrafas e seringas vazias. A dormir ou morrer, quem há de saber? Velho Fuzil, pobre mulher, por sorte não saberia jamais.

            Havia ali – no inferno – uma multidão de pessoas – almas – devotas, entregues a perdição. O estilo musical chulo e popular, com letras alienadas, monótonas, sexuadas e previsíveis. Velho Fuzil jamais haveria de discriminar – no sentido excludente – a população adepta a qualquer valor divergente dos seus. Jamais dirigiu-se desrespeitosamente, nem mesmo em pensamentos, às pessoas que “cultuavam” tal estilo musical. Entretanto, naquela noite, especificamente, Velho Fuzil tinha em seu estado de espírito, uma pessoa sorumbática, meditabunda, ensimesmada. O que a possibilitou olhar de um ângulo peculiar à situação dessas pessoas. Não eram os timbres, ou as pessoas, ou a melodia, mas os comportamentos, as letras, as almas, o inferno. Seria uma via de escape – de péssimo gosto – de vidas monótonas e estafantes? Seria fuga da “cruel” realidade mundana? Seria apenas prazer?! Velho Fuzil jamais saberia.

              Seus olhos mergulhavam por entre as frestas da multidão, de onde saíam as chamas infernais. Havia uma fusão musical, como trombetas do mal, advindas de mil automóveis, cujas distâncias não se valiam a um metro. Havia corpos de todas as formas e cheiros, mexendo-se, requebrando-se, alguns quase que epileticamente, encorajados pelo álcool e sabe-se lá que outras substâncias, poderiam ser as responsáveis, por uma possível “anestesia” ao frio que fazia, visto às vestes quase praianas da quase totalidade das quase mulheres. Quase mulheres? Velho Fuzil está passando dos limites…

            Por que diabos, Velho Fuzil sentia-se no inferno?! Era ela uma mulher tranquila, entretanto, naquele dia, estava vulnerável a perturbações alheias. Aquela multidão toda estaria participando de um rito sexual macabro? Estaria Velho Fuzil velha demais pra suportar aquele evento barulhento?

            Posteriormente pensou consigo mesma, qual seria a razão de, outros “ritos”, de outros estilos musicais não a incomodarem como este? Não seria a mesma coisa? Gente bêbada com pulsão de morte a procura de sexo e descompromisso? Por quê com aquele estilo musical tudo parecera mais macabro?

            Velho Fuzil era uma mulher sábia, não adepta a moralismos, entretanto, naquela noite, deu-se o direito de sentir-se humana, enojando toda aquela multidão sexual e barulhenta, covarde talvez, que fugia – talvez – de alguma coisa em algum lugar. Naquela noite, Velho Fuzil se entregou as sensações aversivas e, de fato, parecia alguém alheio ao cenário previamente instaurado. Sentia-se só naquela multidão infernal, o que a deixava feliz, pois não fazia parte dos ritos macabros, não diretamente. E felicitou-se por conseguir utilizar de seu silêncio interior, naquela noite de sexta-feira, frente a Universidade Nove de Julho.

Imagem** Niarachi Girl**

ÂNCORA

                  Parecia uma sala. Mas não uma sala qualquer. Não se podia definir com clareza o tom de seu ambiente. Quem sabe um galpão? Ou um porão, ou até mesmo um mediano salão?! Era sujo e limpo. Aconchegante e bagunçado. Vazio e repleto de velharias. Espoletas fotografias. Um museu abandonado talvez?! Bem, talvez se tivesse forma humana, não gostasse de ser definido. Apenas apreciemos – partindo de nossa limitada ótica – o que encontrarmos.

            Este lugar tem uma tonalidade escura e um ar sombrio. Entretanto, há algo que sobressai aos olhos robotizados. É uma porta. Grande. Uma grande porta. É branca, mas não tanto. Encontra-se nos fundos deste espaço não definido. De longe parece madeira, de perto não se sabe bem.

Tudo parece igual desde a última visita. O mesmo cheiro, diferente. Os mesmos retratos, quebrados. O mesmo perfeccionismo, desorganizado. Mas, a porta! Esta porta, esta grande porta! Contém um grande cadeado. Todos os séculos que este espaço é visitado, ele mantém-se fechado. Ancestral nenhum saberia dizer o que ali dentro havia, se havia. Durante muitos séculos, chave nenhuma conseguira abrir o misterioso cadeado. Talvez não fosse misterioso. Talvez carregasse no seio, o simples destino de não ser aberto por chave nenhuma, nenhuma que tentasse abri-lo.

              E de novo, e de novo. Em outros séculos, tudo ainda parecia igual desde a última visita. O mesmo diferente cheiro, os mesmos quebrados retratos, o mesmo desorganizado perfeccionismo. Entretanto, na ultima década, este espaço abrigou um fugitivo. Era um bobo da corte do reino Disttant. Era um sujeito que também não apreciaria classificações, se é que apreciaria algo.

            O bobo da corte, ogro, risonho de mau hálito e indiferente, possuía muitas tralhas consigo. Não se sabe se tinha posse de suas faculdades mentais. Fugira do reino por não suportar nenhum barulho. Quando as tropas se aproximavam para treinamento, na melhor das hipóteses se escondia, na pior, tapava seus ouvidos e dançava entre as flechas.

            Mas não na ultima década. Nesta, precisou fugir, pois aqueles estímulos potencializaram-se de tal forma que, todas as figuras do reino se fundiam dentro de sua cabeça. E lá estava o bobo da corte, o fugitivo bobo da corte, se escondendo no espaço não definido.

          Cheirava tudo que via. Objetos antigos como aqueles, ele não vira em seu reino. Descobria o espaço não definido como um selvagem feroz. Manipulava as fotografias e as jogava em outros lugares. Espalhava os objetos desorganizando a desorganização pré-colocada.  Ao ver a porta, cheirou-a também. Em meio as suas tralhas, pegou uma chave e abriu às pressas e brutalmente o cadeado. Aquele cadeado! O bobo da corte! Ele tinha a chave. Finalmente descobrir-se-ia o que havia atrás daquela porta secular. Ele abrira o cadeado, a ação seguinte, seria abrir a porta…

             Mas o bobo da corte ausentara-se de cena! Onde estaria? Fugindo? Dormindo? Ou desaparecera? Voltaria? Será?! Não se sabe.  Não nesta década. Mas talvez a função do bobo da corte, fora apenas abrir o cadeado. Seria ele era bobo demais para abrir a porta, ou não?!

Niarachi Girl

 

MASK

Quero pintar!

Quero colorir a alma,

A mente e o coração.

Quero penetrar,

O âmago disso,

Que parece paixão.

Quero arriscar,

Pôr tudo a perder,

Tudo isso, que nem sei o quê!

O branco da face,

Mascara o cinza dos fundos,

Dos fundos, mundos e imundos.

Meu suposto ódio de sua incerteza,

Tornou minhas unhas viúvas negras.

Está tudo bem,

Como o cósmico do dom,

Mas amanhã, por favor,

Não tire o vermelho de meu batom!

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**Niarachi Girl**

Missing!

O medo da saudade enlaça a dama.

A resposta da dama,

Deveria atingir a couraça do cavalheiro.

O cavalheiro não é homem.

O homem é nascituro.

Sob controle de estímulos está a dama,

Está o rato, e o cavalheiro.

A resposta é isso e aquilo;

Isso elicia lágrimas,

Aquilo esboça sorriso,

Ambos colorem a magnitude dos batimentos,

Do órgão, o alienado.

Aversão beijando assertividade.

Na depressão da melodia,

Olhando o relógio, medindo a latência,

A barra anseia,

Qualquer maldita consequência.

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**Niarachi Girl**

IDEIAS VARRIDAS

               Experimentei algumas vezes embora de ‘gosto’ aversivo. Talvez fosse uma forma de autopunição por permitir a impregnação de sujeiras alheias. Ou mesmo pelo puro prazer de presenciar os próprios pensamentos nascendo, atuando e morrendo em meio à fumaça. Não! Não acho que falo do cigarro. Falo da vida; falo do que se viveu e o que se deixou morrer.

          O violão não chora desde os 15. As cifras? Nem me lembro. As feridas cicatrizaram. Nasceram, morreram, e simplesmente migraram. Os sóis queimaram a pele, e os esboços de sorrisos enrugaram a face. Os livros ainda permanecem na estante, fechados, malditos, trancados. Fechados, e assim como eu, esperam por mim; para abri-los, decifrá-los, e devorá-los.

            A introspecção nunca me deixou. Está sempre me sondando e invadindo. Deixa-me cheia, vazia, chata, e carecida, como naqueles dias nublados em que qualquer porcaria escrita fica apreciável se lida por uma voz amena. A poeira ainda me traz dores e odores. As ideias? Varro, espalham-se. Varro, espalham-se. Deixei que escapassem, espalhassem-se enquanto ocupava-me de varrer outras coisas.

            E nessa introspecção incansável e necessária, tudo que exercito é uma auto-plástica. Quando olho ao espelho, vejo que pouco mudou. Quando olho pra dentro, por vezes ainda caço um ou outro eu antigo, enquanto me apresento aos contemporâneos.

           Não deitei por prazer, julgaram-me. Não deitei por amor, julgaram-me. Não deitei, ainda, julgaram-me. Não liguei, julgaram-me. Não poderia submeter-me a sedução de um cálice suado. Não! Deveria preservar a esta consciência amarga e tentar ouvir o que ela quer dizer a mim, sua suposta titânides. Diz-me ela coisas não ditas, ideias varridas e pensamentos mal projetados. Que só diz a mim quando vocifera suas amarguras ‘sozinha’.

    E quem já nasceu e morreu dentro de mim, nasce outra vez. Colore-me a vida e a nuca. E que não se deixe apagar e morrer como o resto das cinzas, dos rasgos e costuras deste mundo. Que mate minha ávida sede, e deixe-me saciá-lo de sua nobre fome; Eu, que aprecio o ato de supreender-me com pequenas e grandes imperfeições que somente são vistas mais de perto. Aproxima-te! Afasta-te! Reaproxima-te sempre, e afasta-te brandamente, sempre pra perto de mim.

        E é assim, com esta ventania inevitável, um vendaval amável, que minhas ideias varridas espalham-se novamente. Nada está a seu posto. Tudo o que varro, o vento bagunça de novo; e de novo, e de novo. E desta vez, minhas ideias varridas parecem melhor espalhadas.

(…)

** Niarachi Girl**

 

VIAGEM AO MUNDO INTERNO

    Visitou o mundo meu,

    Aquele eu.

    O mais atrevido e sensível,

    Dos meus eus.

    Estranhou o mundo meu,

    Aquele eu.

    Apreciou o meu eu,

    O mundo meu.

    Lá fora,

    Outro mundo desabava.

    E o mundo meu, dentro de si,

    Protegia aquele eu.

    Não retornou do mundo meu,

    O introspectivo,

    Do meu eu.

    Talvez,

    Tenha se perdido, ou se camuflado,

    No meu eu,

    O mundo que é meu.

** NIARACHI RAIAZAC **

ADJETIVOS PROIBIDOS

           Sinto-me ambivalente! Esboçar sorrisos, e derramar lágrimas, simultaneamente, está por se tonar um vício, que, já nem sei, se faz-me bem ou mal.

           Sinto-me só! Vivo às voltas comigo mesma, temendo desenterrar coisas que não fui eu quem as enterrou. Mas sei que é a mim que elas querem.

         Sinto sensações únicas, minhas, ancestrais, surreais, que estremecem-me a carne, invadem-me a mente, roubam-me o silêncio; não as compreendo, mas as sinto.

           Sinto-me explicitamente implícita! Percebi que projeto minha bagunça mental num espaço parcialmente público. Ah! Que se danem as esferas públicas e privadas! Escrevo para mim, ou para o que penso ser eu. Alto lá! Comprei de uma jovem feiticeira, de madeixas avermelhadas, um diário medieval, com rosada capa de couro, e uma caneta, cujo corpo é envolto por uma pena negra. Seja como for, aquelas folhas pardas estão prometidas para meus Pedaços Proibidos.

        Sinto-me estagnada! Dei-me conta de que tive preguiça! Preguiça de salvar-me, e, em alguns momentos, até mesmo de adoecer. Tive preguiça de lutar, defender-me. Tive preguiça de arrepender-me. Tive preguiça de coisas que tenho preguiça de lembrar.

       Sinto pressa! E eu, perfeita amante de parábolas, jogos e provocações, vejo-me cansada de tudo isso. Sinto-me clara e objetiva, a meu modo. Todavia, é de meu conhecimento, que tamanha objetividade é apenas uma fase; Afinal, Implícita e Parábolas são meus sobrenomes.

         Sinto-me aventureira! Custei a acreditar, que fui capaz de perder uma partida, quando jogando contra eu mesma. Eu, e eu, estávamos ali, frente a frente, eu e meu eu adversário, que derrotou-me facilmente.

        Sinto-me inscrita! Espanto-me sempre que me pego escrevendo em primeira pessoa. Eu! Eu! Eu e eu, nós não éramos assim. Não éramos assim antes, nem ontem, nem mesmo no segundo anterior a este. Há dias em que sinto-me como uma metamorfose, cujo relógio corre em disparada. É outro tempo, diferente do tempo do mundo dos homens. Ah! Os homens! O mundo! Penso que ainda que eu falasse a língua dos homens, permaneceria em meu silêncio introspectivo, até que eu pudesse gritar algo de tradução universal.

     Sinto-me fraca, invadida, invalidada, incompreendida, cristalizada, odiada, desleixada, pessimista, otimista, realista, sonhadora, cansada, frustrada, faminta, necessitada, preocupada, atenciosa, desgastada, eufórica, irreal, inocente, empobrecida, invisível, pecadora, angelical, pensativa, intelectual, sensível, incomunicável, diabólica, vadia, cruel, introspectiva, repetitiva, pesada, vaidosa, chorosa, risonha, ladra, regredida, negligenciada, suja, supérflua, infiel, selvagem, carinhosa, esquecida, violenta, gulosa, viajante, amorosa, apaixonada, desiludida, abandonada, preguiçoooosa. Ah, a preguiça! Tenho preguiça de meus mil e um adjetivos permitidos e proibidos.

Pedaços Proibidos

                                                                       **Niarachi Girl**

EXPLOSÃO DA MULATA

A mulata que agora só quer cantar,

Cantar Rock n’ Roll e ver o sol raiar,

Não sabe o fim em que tudo vai dar.

Mas quem disse e vê,

Que a mulata quer saber,

O fim do amanhecer?

Engana-se, pois ela espera para ver!

A mulata tem preguiça, de racionalizar,

Prefere descobrir, à idealizar,

A melodia, frente ao seu nariz, e paladar.

 Tem gente que pensa que conhece a mulata,

Chamam-na de ingrata, e ficam a espera de arrebatas.

Alguns poucos coitados, até veem-na como ‘sapata’.

Todos estes, limitam-se a pobres ignorantes,

Não merecem ver da mulata, seus secretos diamantes,

Que ela guardou, a seu desconhecido amante.

A mulata ganhou um felino,

E desfez-se de muitos roedores.

Vive agora num lar branquinho,

Longe de imundos corredores.

Andou triste a mulata, meio chorosa,

Sem nenhum sorriso, em nenhuma hora.

Mas agora, tem mulata em boa explosão,

E alto som de música, na varanda do coração.

**Niarachi Girl**

ADORAVEL CORTIÇO

I

Nos cabelos de doces feras,

Viu a mansão da liberdade.

Um castelo de meia idade,

Que carregava mil e uma cores,

De sensações incontroláveis.

Doces feras,

Possuíam cabelos sedutores e embelezados,

Se, observados a distância.

II

Por entre seus cabelos,

Havia odores e sujeiras inimagináveis.

Por fora um castelo,

No interior, uma lástima.

Viveu na sujeira,

Observou a procriação da imundice.

A sujeira de lá,

Invadiu sua sujeira própria.

Estava tudo imundo.

 

III

Pelos cantos,

Infinitos insetos e gigantes roedores.

Pelos corredores,

Dores, e odores.

Esquecera-se da existência de privacidade!

Jamais poderia banhar-se sob a luz, e descalça.

Jamais poderia sentar-se e esvaziar-se.

Fazia-o sempre em pé.

IV

Sua pele,

Sua mente,

Encontraram o habitat perfeito para adoecer,

Para germinar as sementes que em si jazem.

Sentiu incontrolável coceira em sua mente, e em seu corpo.

Ambos coçavam, e, ambos possuíam graves feridas.

Pomadas e choro.

Era ao espelho o rito diário de sua dor.

V

Tudo se atropelava.

Mesmo com tudo trancado,

Tudo sumia.

Tudo se furtava.

Tudo se enganava. Tudo aborrecia.

Às noites não se dormia.

Muito se chorava.

Aos dias não se comia,

Não se estudava ou trabalhava,

E muito se dormia.

VI

Entretanto, e pela dor,

Muito, e muito se aprendeu.

E quando soube que deixaria o adoravel cortiço,

Percebeu o quanto ignorava,

Tudo a sua volta,

Desde que chegara.

VII

Deu-se conta de que,

Já havia presenciado grandes eventos,

Aos quais preferira esquecer, fingir não ver.

E que, frente a pequenos acontecimentos,

Era tomada por nojo,

Nojo, e intensa pressa de ávida fuga.

VIII

Finalmente, na mudança,

Havia uma mudança!

Colocaram naquele caminhão,

Todas suas tralhas e seu coração.

Ainda imundos, a espera de transformações.

ADORAVEL CORTIÇO por Niarachi Girl**Chinaira Raiazac**

CIBELE

                             Entre as Sociologias, Interdisciplinaridades e Crises, acrescentou-me saberes acadêmicos pautados em honestidade, espontaneidade e naturalidade. Para além de aspectos instituintes e instituídos, mostrou ver além dos números, sujeitos; sujeitos de suas histórias, cujos interesses, manifestaram-se de formas especificamente peculiares.

                         Observei que como gesto de carinho, e, naturalmente, infiltra-se na vida daqueles aos quais muito ensina, cativando-os. Ensina-os mais do que ela própria pode imaginar. Quase rainha que rejeita a coroa do temor, aproxima-se de seu povo através da conquista, amizade, carinho e respeito. Dona de grande parte de minha admiração, confirmou meus antigos pré-conceitos sobre sua doçura humana. Confirmou, e confirma, a cada dia, a cada gesto terno de sinceridade. Uma forma de ser, que para além das curiosidades rotineiras, compreende o ato de solidariedade, e de amor para com seus próximos. Mãe, mulher, esposa, docente, profissional; são pedaços da superfície de um ser abissal.

                        Reunindo cada um de seus pedaços, cativa naturalmente diversos admiradores. Mostrou-me, dentre muitos, seu aspecto maternal, oferecendo ombro, colo, amor e sinceridade. Estabelecemos diversos laços de identificações, ainda que também por histórias sofridas. Obrigada! Obrigada por infiltrar-se em minha vida… Hoje, sua carne, jovial, completa mais um ano, no mundo do relógio real. Entretanto, o espírito da rainha permanece num pedestal jovial. Seu espírito rejuvenesce a cada sorriso esboçado, até mesmo frente a acontecimentos adversos. Não envelhece, só amadurece. Obrigada pelos feitos, e por mais do que podes imaginar. E foi através de pequenos gestos, que destacou-se teu brilho aos meus olhos. Obrigada por tudo! Parabéns, e, Feliz Aniversário!

**Niarachi Girl**

NÃO SENTIDOS

                             

                                       I

 

Hoje não ouço música. Não sinto cheiros, e nem tenho cores.

Como poderia ser isso verdade, se tudo é música, tudo é cheiro, e tudo é cor?

Para cada instante uma música, seja no plural ou singular.

Para cada instante, um perfume, odor, aroma, um cheiro.

E para cada instante, uma ou mais cores. Tudo tem cor.

Tudo é música, cheiro e cor!

 

                                  II

 

Pobre dos que anulam cores, em suas condições de cores,

Por não serem cores, quentes. São cores! Frias. Ainda assim, são cores.

Cores quentes ornam seus tons em dias felicitásseis,

E cores frias, ornam seus tons em dias funestos,

Quem ordenou isto ‘regra’, com tanta bobagem? Estes próprios deveriam suprimi-la.

É bem verdade, que minha alma enleia todas as cores!

De tons em tons, e de extremos a extremos, carnavais e cinzas.

 

                                   III

 

Hoje não vejo nada, mas enxergo tudo.

Não falo quase nada, e ouço muito.

Hoje não leio, mas escrevo verdades mentirosas, e até mentiras verdadeiras.

Hoje eu senti, e sinto, o que deveria tê-lo sentido antes, sentido ontem.

Hoje? Sinto? Sentido ontem? Onde eu estive ontem?

Lembrei-me! Mesmo sem tê-lo esquecido… Estive ás voltas comigo mesma.

Depois, Zecchin e Mastropasqua,

Depois Walter e Nicotina. Ah! Ele me deve!

Minha alma enleia quase todos os cheiros, e muitas músicas.

 

                                     IV

 

Apreciei a natureza, que já não é natural em sua totalidade.

Ouvi timbres langorosos disfarçados de simplicidades.

Eram pássaros velando a morte do sol.

Ouvi timbres tétricos que velavam a morte de seu titã,

E, ouvi timbres celebrando o tão desejado inverno.

Ouvi, senti, e percebi a sinfonia de sensações opostas.

Senti, ouvi e vi. Os cheiros, as músicas e as cores de hoje.

Anseio agora, por músicas, cheiros, cores, sabores e dissabores do amanhã.

 

**Niarachi Girl**

ORÁCULO DE MIL NOMES

                    Há exatos vinte e um mil anos atrás, existiu um oráculo. Seu nome não foi revelado, por não ter sido lembrado por seu povo. Tudo o que se sabe a respeito de seu nome, pode ser resumido á uma origem e significado indiscriminados. Sua nomeação teve a participação coletiva de seus confidentes e consultores; no entanto, devido ao fato de não entrarem num consenso, ficou lembrado como ‘O Oráculo de Mil Nomes’
              Não era considerado um oráculo ‘prestativo’ a seu povo, por não atender às suas necessidades básicas. Com esta condição diferenciada, permanecia à disposição da hostilidade de seu povo. Homens e mulheres o consultavam, e sem os resultados projetados, o rejeitavam, cuspiam-no. No entanto, mantinham-no como sendo o real, verdadeiro e único oráculo. Sua condição de oráculo, assim como todos os seus nomes, lhe fora imposta. Seu povo jamais descobrira, que o oráculo não atenderia as necessidades esperadas, justamente por sua condição irreal de oráculo. O falso oráculo, que carregou mil nomes e nenhum, era, na verdade, um enigma, que permaneceu no passado. E mesmo hoje, enterrado, não foi ainda, sequer, uma vez decifrado.
 

**Niarachi Girl**

FALSO MÉXICO

Comemos, combinamos, e nos encontramos.

Rimos e conversamos. Você comeu e todos beberam.

Com falso México, todos nos decepcionamos.

 

Despedimos-nos, e me entristeci.

Sem você, continuamos.

Rimos, conversamos e bebemos outra vez.

 

Falamos, escutamo-nos, e nos opinamos.

Excitamo-nos, saímos, e beijamo-nos.

Fumamos e beijamos-nos novamente.

 

Mesmo de heterossexualidade duvidosa,

Ele beijou duas mulheres.

Ela dormiu. Conversamos.

 

Já longe de tudo, chorei, solucei e não me reconheci.

Pensei que me vinguei, mas me iludi.

De qualquer forma, não me arrependi.

E só no dia seguinte, eu entendi.

**Niarachi Girl**

SENSAÇÕES E SÉCULOS

Uma caneta de tinta azul apresentou um ‘humor instável’. Ia escrevendo e, insatisfeita, rabiscou suas frases, já que não expressavam suas não impressões.

De alguma forma, passeou pelo tradicionalismo de séculos passados. Deixou que aquela caneta, ‘moderna’ e de ‘humor instável’, regredisse sua qualidade e progredisse sua funcionalidade, tornando-se uma daquelas canetas relativamente antigas, criadas no século XVIII, feitas com penas de aves fortes que voavam sobre castelos distantes. Mediante tinteiro profuso, ainda assim, falhou.

De volta ao século XXI, transportou-se a tecnologias monótonas. O teclado do computador, invejou a atuação ‘insalubre’ da caneta do século XVIII, e brincou com a indecisão de dedos miúdos, que assim foram nomeados por um porte maiúsculo. O jogo circulava por entre diversas teclas, entretanto, a tecla ‘delete’ reinou bravamente.

Enfim, seja lá o que fosse ou significasse aquilo, começaria na frase seguinte. Percebeu que os dias ensolarados não eram indiferentes como pareciam. Na verdade, nem eram ensolarados. Apenas contava com a presença da estrela Sol, num céu acinzentado ou azul fosco da cidade de São Paulo, que por sua vez, refletia a poluição da rotina paulistana. Dias ensolarados, digo, verdadeiramente ensolarados, não seriam indiferentes. Certamente que não. Eu soube disso quando senti o sol numa noite. Numa noite de quinta-feira especificamente conveniente. E num feriado nublado, tão cinza lá fora, pude com facilidade, ver cores dentro de mim.

Deste modo, posso afirmar com certa precisão subjetiva, que dias com sol podem ser nublados; assim como dias nublados podem ser ensolarados; assim como tornou-se possível emergir arco-íris sob garoas noturnas. Isso é tecnologia do século XXI, meu século XXI.

Falando em tecnologia, ao usar um meio de transporte público, como metrô, em pé pode-se notar de maneira ampla, que olhar para uma determinada janela, possibilita ver coisas e pessoas lá fora. Nesta mesma janela, quando se para num túnel relativamente escuro, é possível ver a imagem refletida dentro do vagão de trem. Algumas pessoas aproveitam para arrumar seus cabelos ou a própria roupa. Já fiz de tudo um pouco, e de maneira discreta. Mas o que mais gosto, é prosseguir vendo coisas e pessoas lá fora. Não é tão simples porque a situação traz uma maneira pronta de se comportar, uma nova configuração e forma. Esforçar a vista, naquele momento lacônico, e buscar um movimento gestáltico, vendo o que se passa dentro e fora do ambiente, me é excitantemente perturbador. É um exercício natural para poucos.

Fora assim em séculos passados. Um sujeito trinca-pintos poderia sentar-se num sofá num interior de um grande castelo, e perceber tudo a sua volta à sua própria maneira. Seria o movimento número um da situação no metrô. Movimentos gestálticos requerem ação em suas formas e configurações. Entretanto, pareceria mais cômodo permanecer passivo, sentado num sofá do século XVIII, sendo servido por serviçais talvez, sentindo o que todos sentem. Apenas esperando um convite para levantar e explorar.

No meu século XXI, com frequência experimento sensações diversas. Outrora preguiça de preconceitos que emergem ao meu respeito, outrora inconformismo com distorções que não envolvem a mim. Outrora inconformismo comigo mesma. Que pretensão invalidar distorções alheias! Tenho experimentado bons presságios. Deparei-me com temperos excêntricos. Estes, embebidos de ambivalência açoitavam minha suposta candura. Só pude discursar sobre divergências de senso crítico e egocentrismos estoicos.

Entre tantas sensações, só não quero me desprender da fusão entre textos, texturas e tessituras. Da noite, dos lábios, mãos, faces, e temperos que só sinto o cheiro, e quero ainda provar. Provar mais, e sem saciar-me. Afinal, Amor, amor, alguma coisa celta, sensualidade, sexualidade, medo, auto-afirmação, carência, podem ser preenchidas e temperadas. São sensações perambulando
por séculos, e nem sempre ilustradas.

**Chinaira Raiazac**

A MADRUGADA NA FLORESTA

       A madrugada veio desmascarar a totalidade da escuridão da floresta.  Sob uma luminosidade parcial, sentiu a sensação de invólucro, e a floresta pode esclarecer-se, exalando um perfume azafamado. Caminhando, parou na entrada da floresta de sentimentos. Percebeu que o gosto da água que rolava por sua garganta fria, não era como o que se mostrava no rio. Não tinha um sabor veemente e impetuoso de rejeição. Fechou os olhos para sentir o desconhecido sabor com cautela e gozo; Então, sentiu um sabor inebriado de confusão, com um leve toque de sedução. Sua saliva quente morreu em sua garganta que já não estava fria. Por fim, viu-se com ávida sede daquele líquido misterioso.

 **Chinaira Raiazac**

FLORESTA DE SENTIMENTOS

         Parou ás margens do rio indecisão. Olhou, e viu refletida em suas águas impuras, a imagem da dinâmica e flexibilidade, onde mergulhavam conflitos híbridos. Procurou em si a clareza que estava oculta na escuridão do rio. Adiante, próximo ao rio, havia uma pequena entrada para uma floresta sombria. Sombria era o que se projetava. Não havia possibilidades de saber, ao certo, o que a floresta reservaria. Então desprendeu sua atenção de seus pensamentos, quando viu um cadáver nu, boiando pelas águas impuras da indecisão. Algo dentro de si sorria, e, posteriormente, bebia da água da rejeição, enquanto preparava-se para adentrar a floresta dos sentimentos.

**Chinaira Raiazac**

CONFIDÊNCIAS

                  Era a ultima noite de sexta-feira de inverno frio de 1942 na Inglaterra. Ao chegarem num beco escuro, Larry parou o carro. Linda, embriagada, tirou sua blusa e gargalhou.  Larry, que estava relativamente lúcido, e em busca de silêncio, desligou o rádio. (…)

Cotinue –> ConfidênciasPDF ATUALIZADO em 01.11.12

*Chinaira Raiazac*

GUERREIRO E FLECHA

Acordei, não corri.

Calei, não consenti.

Ouvi e me admirei.

Repensei e me superei.

Pensei e me apaixonei.

Hesitei, e repensei.

Li, li, e li. Li e reli,

Como neutrinos, estava tudo ali!

Reinventei-me e descobri.

Fragmentei, e os pedaços, permiti.

Contestei e não dormi.

Viajei e não me perdi.

Mergulhei, e só então, adormeci.

**Chinaira Raiazac**

LISA GHERARDINI

Nesta contemporaneidade sedentária, não vejo os galanteios que vejo em filmes produzidos em épocas passadas. Galanteios cujos rumos se revezam entre apreciação, inveja, múltiplas distorções ou simples esquecimento.

Não vejo aqui o romantismo de diversas faces que, me parece estar aprisionado há tempos, em páginas de velhos livros, que, atualmente, mofam junto á solidão de velhas estantes empoeiradas.

Não encontro nas esquinas de minha cidade, doçuras que costumava ouvir com frequência, em meus favorite oldies songs. Doçuras aquelas que, diversas vezes projetei no vazio, idealizei nas escuridões, e fantasiei em cinzas do que não vivi.

Damas caídas em escassez, escassez de cavalheiros. Cavalheiros vitimizados pela escassez de damas, e pelo excesso de prostitutas que trabalham gratuitamente á luz do dia, prostitutas voluntariadas.

O tradicionalismo em mim, muito apreciou a arte de pinturas renascentistas de mulheres lindas, nuas, sem qualquer artificialidade, que eram naturalmente desejadas com seus corpos reais.

Pela manhã quando acordei, vi em meu planeta, a artificialidade maquiando a realidade de forma avassaladora. Quando dei por mim, vi nas prateleiras dos mercados, produtos inusitados; compram-se cabelos, seios, glúteos, cinturas, lábios e tudo que se puder.

Na prateleira dos instantâneos, a sexualidade está pronta para se aquecer, agora, é imediatista, sem grandes possibilidades de provocar uma imaginação criativa. A moda consiste em masturbação atrás de telas LCDs, encorajada por sexos mal feitos por trás de câmeras digitais negligentes, criando um círculo vicioso, reproduzindo, nos anos seguintes, sexos mal feitos por entre quatro paredes. Quando deixei o mercado, insatisfeita, percebi que os olhares já não dizem tanto quanto diziam nas décadas em que eu dormia. Os olhares se perderam, na carteira de Da Vinci, e no decote da Mona Lisa.

**Chinaira Raiazac**

O AMOR E O EU OTIMISTA

O amor e eu brincamos no escuro.

Ora nos amamos, ora nos magoamos.

Nos encontramos apenas ás escuras,

Sob a luz da minguada e apaixonada Lua.

Sob a luz do impetuoso Sol,

Não somos capazes de nos encontrar.

Por hora, nenhum de nós desistiu de procurar.

**Chinaira Raiazac**

O AMOR E O EU REALISTA

Amor ambivalente, atrapalhado diria.

Diz que ama, embora primitivamente mataria, fugiria.

Quem me ama não me entende, não se entende,

Está fardada a este sentimento rasgado.

Quem me ama é inacessível, não me ouve.

Quem me ama não me entende!

Quem me entende não me ama, nem deveria.

Quem me entende é pago em pequenas mensalidades.

Pago pelas saias de quem me ama, e pelas calças de quem me deseja.

Quem me entende, tenta fazer com que eu mesma o pague,

E não  quem me ama, ou deseja.

**Chinaira Raiazac**

SOMBRAS DE FÉRIAS

Praias desertas, Cinemas, Casinos, Shoppings, Parques de Diversões, ou

Danceterias.

Street Dance e Rock n’ Roll, Hip Hop ou anos 50.

 Vinho, Tequila,

Whisky, Cerveja e Champagne.

Contextos similares, tudo desaparece, tudo inexiste.

Quando a música desaparece, se esconde atrás de vozes monótonas,

E as faces estranhas familiarizam-se uma vez mais.

Sirvo cervejas e cigarros nas mesas, e retorno ao interior do balcão.

Meu Brasil está em Julho.

E eu, outra vez, e em período integral, a mercê de duras palavras conscientes e

posteriores abraços embriagados, todos vindos de dentro do balcão.

**Chinaira Raiazac**

MORTE DESERTA

Havia um deserto. E sobre suas areias tépidas, havia um homem, cuja única companheira era a nudez, até o momento em que a morte passou a cobiçá-lo. Com a sola de seus pés queimadas, e envoltas por bolhas, insistia numa jornada árdua, e, aparentemente, sem rumo. O Sol fervente, e hostil, avermelhava sua pele, e ao redor de seus olhos claros. Seu corpo exalava um odor extremamente masculino, temperado com suor amargo e ardente. Desfrutava de uvas frescas, ao som de boa música. E o vinho, que era servido por belas mulatas, lhe refrescava o colo, ao encharcar-lhe a camisa. E então, mais uma vez, experimentava o sabor da desilusão, ao fim de outro delírio e alucinação. Logo, percebia-se como nu, a mercê da solidão, e as deusas da Miragem, sussurravam risos inocentes aos seus ouvidos. Subitamente, o dourado das areias do deserto, esvaía-se, até que não se via nada, além de uma doce negritude, com cheiro de morte, que roubava sua dor, e devorava sua solidão.    

 **Chinaira Raiazac**

CONSTRUINDO PRIMAVERAS

Tenho ainda tantas canções a minha espera,

 Canções para cantarolar, canções para descobrir,

 Tantas delas para apreciar, e outras, simplesmente a ouvir.

 

Tenho ainda tantos sorrisos a esboçar,

Outros à inocentemente eliciar, e em seguida, apreciar.

Tantas lágrimas em minha face ainda por rolar,

Outras tantas a consolar, deixar que rolem, e em seguida, enxugar.

 

Tantos filmes que ainda não vi, não encenei, ou produzi,

Tantos livros que ainda não li, não colaborei ou escrevi,

Tantos lugares que desconheço, e que sequer em sonho, os visitei.

 Tantos amores que desmereço, e que um dia os viverei.

 

Outonos, Invernos e Verões! Tanto a ensinar, e tanto a aprender,

Tantas primaveras pelas quais lutar, e outras tantas, a ceder.

Primaveras! Primaveras a racionalizar, e primaveras a sentir.

Primaveras a esconder, e primaveras a descobrir.

**Chinaira Raiazac**

A IDADE DO ESPELHO

                  Ao levantar tropeçou em suas garrafas de uísque barato, bocejou, juntou os lábios e coçou a cabeça. Um olhar ao redor do apartamento refletia seu desespero e amargura. As cinzas de seus cigarros exalavam um cheiro forte que não o incomodava. Olhou para sua cama, viu duas prostitutas, cujas formas físicas não lhe eram mais atraente nesta manhã, e se lembrara da noite que tivera, mais uma vez, aos braços da embriaguez. Acendeu um cigarro, ligou rádio. O noticiário era de alguma forma, o mesmo de ontem, e o mesmo de amanhã. Tirou o roupão. Sob o chuveiro, lavava sua dor. O banho era mecânico e silencioso, sua expressão facial transparecia pensamentos relativamente desnecessários.

            A tarde se ia, toda vazia, como tantas outras. O anoitecer trazia diversos corpos, tão diferentes, e tão iguais. Diversos copos, taças, garrafas e cigarros que consolavam sempre as mesmas dores. Corpos quentes, corpos frios, vendendo-se por trocados que sustentariam vícios esdrúxulos, e na manhã seguinte, ele mal sabia os nomes delas. Deitar-se com prostitutas atingia, agora, um patamar tedioso, brochante.

           E na mecanicidade da rotina, esvaía toda sua essência complexa. Olhou ao espelho, viu seu passado, repudiou seu presente, procurou seu futuro. Seus cabelos grisalhos lhe questionavam: “É só isso?”. Franziu a testa, e ouviu respirar a solidão. Por entre a ferrugem do espelho, refletia seu ego, que lhe dizia: “Talvez isso seja aquilo chamam de crise da meia-idade”.

 **Chinaira Raiazac**

BRINDES DE ABRIL

Um brinde à tempestade em alto mar,

Que miscigena pesadelos, e desejos de sonhar.

Um brinde ao amanhecer, que ilumina os prazeres de amadurecer.

Um brinde à escuridão, que incita a paixão, limita controles, e à projeção.

Um brinde ao meu relógio, e à minha ação.

                                                 **Chinaira Raiazac**

SAUDADES DE MIM

Que saudades de meus versos.

Saudades desta insanidade sem censura!

Que saudades, destas parábolas,

Saudades de tão conexas palavras.

Que saudades!  Saudades desta escrita perpétua,

Que esteve condenada ao silêncio, prisioneira da rotina.

Viva! Viva à sua liberdade assistida!

**Chinaira Raiazac**

MEDO DE PERDER MEUS MEDOS

Não me amedronta a tal escuridão,

Amedronta-me pensar na infeliz possibilidade de a luz estar sempre acesa.

Não me amedronta o envelhecer,

Amedronta-me o simples cogitar em trair a beleza e graça de minhas rugas com um preenchimento de silicone barato.

Não me amedronta a queda,

Amedronta-me não prover de desejo e forças para levantar-me, reerguer-me.

Não me amedronta a solidão,

Amedronta-me cogitar a possibilidade de, às vezes, não poder ficar só.

Não me amedronta a multidão, mas a solidão nela camuflada.

Não me amedronta o sofrer, mas sim o não me apaixonar.

Não me amedronta o perder, mas sim o não lutar.

Não me amedrontam os monstros, mas sim os falsos anjos.

Não me amedronta o silêncio, mas sim o não gozar da música.

Não me amedronta a presença do comum,

Amedronta-me a cruel ausência do incomum, do extraordinário, excepcional, o belo.

Não me amedronta a morte, amedronta-me o não viver.

Não me amedronta falhar, amedronta-me o não tentar.

Não me amedronta o medo, mas, sobretudo desfazer-me de meus medos.

**Chinaira Raiazac**

AS PRETENSÕES E O TALVEZ

Talvez eu nunca ame ninguém.
Talvez eu nunca corresponda uma paixão.
Talvez se apaixonem por mim, por desconhecerem o perigo que represento.
Talvez eu nunca olhe nos olhos de alguém e veja aquele tal brilho, daquela tal maneira.
Talvez, talvez hoje, talvez amanhã, a chuva faça sentido.
Talvez semana que vem, eu esqueça o que não conheci,
Talvez eu me desapegue do que ainda está por vir.
Talvez eu procure um olhar na lua, e talvez um humilde pedinte cante para mim.
Talvez eu esteja lá, ou talvez eu esteja longe, talvez esteja na lua, talvez nua.
Talvez eu receba um abraço esta manhã.
Talvez eu grite pelos cantos, lá por dentro, em meus prantos.
Talvez eu volte a ver aquilo que jamais vi, ou ouvir aquilo que não me disseram.
Talvez ainda haja alguém que aprecie minhas velharias musicais.
Talvez, talvez, talvez! Talvez essas palavras não terminem por aqui.

** Chinaira Raiazac**

DISPA-SE

Vou me deitar e te esperar,

Quero que dispa-se de seus anseios, temores  e pensamentos,

Estou nua a te esperar,

Quero que dispa-se de seus dotes, traga-me somente o teu doce charme.

Estou a gritar por um estranho que me compreenda,

Dispa-se de tudo que aprendeu com as mulheres que possuíra antes de mim.

Dispa-se de tudo que buscou em outros corpos, pois está tudo aqui agora.

Dispa-se! Ordeno que dispa-se de tudo que sonhou,

Pois  eu estou aqui, abrace-me,  e veja eu estou aqui.

Enrosca sua paixão em meus lábios, roçe tua barba em minha nuca.

Estou nua, a sua espera, dispa-se sem temor,

Faça comigo o que quiser, só não chame-me de amor, para evitarmos a desgraça e a dor

Dispa-se por mim, possua-me por nós!

Dispa-se delas quando estiver comigo,

E dispa-se de mim quando estiver com elas,

Dispa-se da lucidez para possuir-me embriagado.

Dispa-se do orgulho, vista o prazer

Dispa-se de futuro só por este momento, vista o presente,

E quando tudo acabar, dispa-se de mim, e vista o que quiser.

**Chinaira Raiazac**

A BELEZA DA DESGRAÇA

Chove!
Encanto-me naturalmente.
Aprecio as gotas da chuva tanto quanto aprecio os raios do sol.
Apaixono-me pela negritude do céu, tanto quanto me apaixono pelo seu azul celestial.

Um coração se parte!
A beleza do espetáculo tem um tom ambíguo, tão frívolo e tão essencial.
Ele se fere com sua própria inocência por acreditar, uma lágrima cai, é doce, é sagrado.
Tão sagrado quanto quando ele se cura e adoece novamente, docemente, envenenado.
Tão doce quanto extrair amor da desgraça, cura do veneno, água do deserto.

Morte!
Doce morte de pragas e amores, de anseios, desejos, temores e falsos consolos.
Encanto-me com sua apreciação fiel, tanto quanto a apreciação da dor.
A dor que mata as mais cruéis pragas do ser, possibilitando o nascimento de novas pragas.
A dor que é apreciada á altura do salto alto da vida, que lhe fere os pés e alonga tua silhueta.

Lágrimas!
Sujam tua face, borram teus olhos e lavam tua alma.
São doces, são amargas, são fúteis, e necessárias.
São desprezíveis e belas, são minhas, são tuas, são alheias, não pertencem a ninguém.

Sangue!
Deve ser apreciado quando derramado em nome de maior paz e menor prejuízo,
Deve ser apreciado sob a lua, pelo vampiro chamado vida.
A beleza do sangue deve ser apreciada tanto na essência de sua frieza e cauculismo,
Quanto em sua essência febril, lasciva e ardente.
Chuva, dor, morte, lágrimas, sangue, e o infinito, é tudo tão sagrado quando se olhado de novos ângulos, encontrei o meu ângulo, e vejo a beleza da desgraça.

 

**Chinaira Raiazac**

A SEDE E EU

Sede! A sede passou por mim, e está aqui.

Sede! Senti a sede daqueles tempos e sinto a sede de agora.

Não soube dizer de onde vinha ou o que mataria aquela sede.

E ela retornou á mim. Talvez a resposta se aproxime agora.

 

Eu vejo o pote cheio, cheio; quase transbordando e me inundando.

Porém delicio-me com cautela. Eu quero sentir a sede frente ao pote cheio.

Quero torturar-me com essa sede manuseando e fitando aquele pote.

Quero sentir minha saliva gritar pelo pote enquanto ainda torturo-me com cautela.

 

Sede! Eu hei de saciá-la, quando eu assim desejar.

Sede! Aproxime-se, eu devo encará-la.

Sede! Aproxime-se, desejo nos torturar.

Amiga sede, você vai mesmo morrer.

** Niarachi Raiazac**

DIZIA-ME O SILÊNCIO

Sussurrou aos meus ouvidos esta manhã.

Dizia-me que o pior inimigo do homem poderia ser também seu leal amigo; meu amigo.

Disse-me que o ‘tempo’ pararia frente a mim quando eu assim o ordenasse, pra que eu pudesse olhar em teus olhos, tocar sua face; a face do tempo.

E então o devaneio inferiu que neste determinado momento os pesadelos de minha alma seriam dilacerados, e os sonhos, até então aprisionados, seriam libertados. Porém eu discordei.

Não posso permitir que minhas sombras sejam destruídas, pois fazem parte de minha constituição. Não permitirei minha auto-destruição.

Filosofou-me o tempo ainda, que a arte não é feita somente de belos apetrechos, esta engloba também a desgraça própria ou alheia.

Dialoguei minha concordância, expressando minha incapacidade de atração por pensamentos idealizados. Expressei ainda, minha paixão por pensamentos realistas e abrangentes; abrangentes de amor somado á desgraça, miséria somada á compaixão, inveja somada á bondade. Abrangentes da vida como um todo.

Respondeu-me com um sorriso malicioso que minha ótica humanista proporcionaria-me menor sofrimento, e maior aptidão á sabedoria.

Dizia-me que o amor é uma filosofia única, embora explicada por diversas mentes e corações.

Que é algo superior a linguagem verbal á que os mortais recorrem na tentativa de assim expressá-lo.

Diante do que, mencionei que os mais acometidos são os tolos, logo são os mais sábios.

Ignorou minha colocação enquanto argumentava sobre felicidade.

Dizia-me ser algo interior ao sujeito, ao passo que os homens buscam-na ao exterior de si próprios.

De acordo, completei reconhecendo a importância contextual, porém atribuindo maior relevância ao mundo interno. O silêncio machucara-me, então abri meus olhos, olhando-me ao espelho, deparei-me com o SILÊNCIO.

** Niarachi Girl **